quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Causas da Decadência dos Espaços Verdes

O que dizem os autarcas

 
O Brasão de Montijo, no Parque Municipal Carlos Hidalgo Loureiro, é o espelho da decadência dos espaços verdes.
Interrogam-se os montijenses das causas da decadência de Montijo e, em particular, do desleixo a que foi votado o espaço público, que patenteia ruas esburacadas, passeios ardilosos, passadeiras de peões sumidas e jardins descuidados.

É certo que a Câmara Municipal de Montijo desde sempre tratou dos espaços públicos, por isso, a gestão do pessoal e do património não é coisa nova, a não ser que alguém tivesse andado distraído todos estes anos.

Cada montijense encontrará um fundamento para explicar este mau estado de coisas a que o Montijo foi votado, mas, no que concerne aos espaços verdes, é possível saber a opinião de dois ilustres autarcas montijenses.

Quantos jardinerios serão necessários para limpar esta bica utilizada diariamente por crianças de tenra idade? [Parque Municpal]

Presidente da Câmara Municipal de Montijo, Dr.ª Maria Amélia Antunes:

«Relativamente aos jardins, houve um período de férias que atrasou um pouco a manutenção dos jardins e não tivemos a oportunidade de desenvolver o procedimento para o tratamento dos espaços verdes para a freguesia do Afonsoeiro. Assim, tivemos de repartir os funcionários, também por aquela zona, o que levou a que alguns espaços verdes não fossem devidamente tratados, como habitualmente costumavam estar. Pensamos que dentro de dois meses a situação se recomponha.»

Será que é a Lei n.º 8/2012 que não permite que se cuide desta gaiola?

Vice-Presidente da Câmara Municipal de Montijo, Eng.º Nuno Canta:

 «Durante o período de verão tivemos muitas dificuldades operacionais. O fato deste procedimento não ter avançado também prejudicou muito e o procedimento não avançou porque a Lei n.º 8/2012, a Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, não permite cabimento orçamental.
Também tivemos alguns trabalhadores que entraram em idade de reforma, temos neste momento 23 jardineiros operacionais.
Na cidade de Montijo temos cerca de 50 ha de espaços verdes e na ótica de uma excelente produtividade seria um jardineiro por ha e como só temos metade dos jardineiros que desejaríamos, não conseguimos ir mensalmente a todos os espaços públicos. Neste momento estaremos a ir de dois em dois meses, o que origina relva muito elevada.»


Caminho de acesso à gaiola muito utilizado por crianças. São visíveis as "armadilhas".

Ruky Luky

domingo, 28 de outubro de 2012

As Bandeiras de Montijo


Brasão, Bandeira e Selo de Montijo

Pouco se conhece acerca da existência da bandeira de Aldeia Galega [Aldegalega] do Ribatejo.
 
Bandeira utilizada nos actos oficiais, em Aldegalega do Ribatejo, até à implantação da República
Em 1852, o presidente da câmara, António Sustância, informava ao Administrador do Concelho que «no Arquivo da Câmara não existem cunhos ou sinetes alguns com as Armas ou Brasões tanto desta Vila como de Canha, nem mesmo Selos que tivessem servido na Câmara ou outras autoridades.»

No princípio do século XX, José de Sousa Rama dá notícia de um brasão que foi desenhado e oferecido à Câmara Municipal por Rosendo Avelino Rodrigues, mas que a Vila nunca o viu reconhecido nem o utilizou.
 
 
Brasão de Rosendo Avelino Rodrigues
A primeira bandeira de Montijo, proposta de Afonso d’Ornelas, só foi executada e hasteada em 1931. A vila passou então a hastear a bandeira amarela e verde, com cordões e borlas de ouro e verde; lança e haste de ouro, coroa mural de prata de quatro torres; listel branco com letras pretas. Armas de prata com um monte de verde, realçado de negro, cortado por um rio ondado de prata e azul. Cruz de Santiago púrpura acompanhada de dois lemes de negro com ferragens de ouro e estes acompanhados por dois ramos de espigas de trigo, de ouro, bordadas e folhadas de verde e atados de vermelhos.
 
Pimeira Bandeira de Montijo. Não mereceu aprovação do Ministério do Interior.
Na edição de 8 de Março de 1931, do jornal “Montijo”, encontramos a descrição da simbologia do novo brasão:

«No escudo, com campo em prata, por representar humildade, um monte nascendo no meio das águas do rio tejo, representativo de Montijo, o mais importante símbolo da região, encimado pela cruz de S. Tiago a cuja ordem pertenceram todos estes vastos territórios entre “Tejo-Sado-Oceano”.
Espigas de oiro representativas da riqueza agrícola ou seja a transformação sofrida nas terras galegas em sucessivas gerações.
Vieira d’oiro e os dois lemes representativos da riqueza marítima e dos antepassados mareantes.»
 A bandeira adoptada pela Câmara Municipal de Montijo não mereceu a aprovação do Ministério do Interior, facto que só foi conhecido pela autarquia em 1964.

Quando Montijo ascendeu ao estatuto de cidade, em 14 de Agosto de 1985, tornou-se mais imperiosa a necessidade de dotar a urbe de Bandeira, Brasão e selo devidamente legalizados.
O brasão da vila não apresentava qualquer erro de heráldica, embora a Comissão de Heráldica da Associação dos Arqueólogos Portugueses considerasse que, do ponto de vista estético, patenteava uma superabundância de elementos e, em conformidade, propunha algumas alterações para melhorar o seu aspecto.





Propostas da Associação dos Arqueólogos Portugueses
 Diferente, porém, foi a opinião das forças vivas do concelho que, na reunião pública realizada no dia 2 de Outubro de 1985, optaram pelo anterior brasão, com as ligeiras alterações impostas pelo rigor histórico.
A Vereação, reunida no dia 23 do mesmo mês, acolheu a sugestão, que foi aprovada pela Comissão de Heráldica, no dia 30 de Outubro.

A leitura das armas de Montijo passou a ser a seguinte:

«Brasão – de prata, um pequeno monte de verde, realçado de negro, movente dos flancos e assente num contra-chefe de cinco faixetas ondadas de prata e azul; em chefe, Cruz de São Tiago de vermelho, acompanhada de dois lemes de negro com ferragens de ouro, adossadas, o da dextra posto em banda e o da sinistra em barra de dois molhos de espigas de trigo de ouro, folhadas de verde e atados de vermelho. Coroa mural de cinco torres de prata.
Listel branco, com letras a negro “Cidade de Montijo.


Bandeira – gironada de amarelo e verde, cordão e borlas de ouro e verde.
Haste e lança de ouro.
Selo – circular, tendo ao centro as peças do escudo, sem indicação de esmaltes, tudo envolvido por dois círculos concêntricos, com os dizeres “Câmara Municipal de Montijo”».

 
Com a publicação no Diário da República III Série, de 4 de março de 1986, do Aviso da Câmara Municipal, Montijo desfraldava, pela primeira vez na sua História, a sua bandeira devidamente legalizada.

Ruky Luky

 

 

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Mr. Sousbié Convida

A Exposição Automática e Científica da Sociedade Artística de Paris

 No final do século XIX, Aldegalega era ainda a porta sul de Lisboa, ponto de paragem obrigatório para se alcançar a capital do País, e esta localização privilegiada transformou-a num palco dos mais diversos entretenimentos, fosse um urso amestrado a passear pelas ruas, uma barraca de saltimbancos, ou uma exposição.

Em 1900, a população de Aldegalega foi surpreendida pelo convite de Mr. Sousbié para visitar a «Maravilhosa Oleóptica, da Grande Exposição de Paris», colecção de peças mecânicas, desconhecidas em Portugal.
A exposição compunha-se de «objectos e de uma grande colecção de vistas modernas». Tratava-se de um pavilhão de curiosidades.

O Convite referia-se à «Exposição Automática e Científica da Sociedade Artística de Paris» e enfatizava que «Mr. Sousbié acaba de receber um sortimento de peças mecânicas de um trabalho e imaginação, o mais completo que se pode exigir, das principais cidades da Europa: é uma colecção inteiramente desconhecida neste país, de diferentes artigos da mais alta novidade, sem rival, e que se pode classificar – Non plus ultra da Europa. Mr. Sousbié escolheu uma colecção de gosto(…). Por este motivo convida todos os amadores e artistas portugueses a virem ver a linda produção dos mestres das melhores oficinas da Europa, em que se revelam as mais sumptuosas ideias artísticas.» 
A entrada era franqueada a partir das 18H00, ao preço 60 réis e de 40 réis para crianças e militares sem graduação, na casa da viúva de José Bento, perto da Rua Direita.



Quem visitasse a “Maravilhosa Oleóptica” podia apreciar o Domador de Serpentes, ver a Resignação de Cleópatra, ouvir Música automática (piano), admirar a Grande Valz, executada por marquês e marquesa no tempo de Luís XIV, encantar-se com a Rainha do Congo, observar a Vista à Roda do Mundo representada pela artista Sarah Bernhardt, e divertir-se com as Cenas Cómicas e Transformação de Fisionomias. A par dos objectos, a exposição patenteava também uma Grande Colecção de Vistas Modernas, retratando o Enterro de Victor Hugo, a Batalha de Toukin, Franco-Prussiana, o Princípio do Mundo até à Morte de Cristo e a Vista Geral da Exposição de Paris de 1889.

Um regalo para os olhos, um espanto para a imaginação.

A exposição transitou, depois, pelo País.

Trabalhava-se então de sol a sol, em Aldegalega. A vida corria rude pelos campos, pelo rio e pela vila. Ainda assim, o aldeano não dispensava a diversão, sobretudo aos fins-de-semana, em que os bailes que se realizavam no salão «primorosamente ornamentado de flores» da Sociedade Filarmónica 1º de Dezembro ou do Novo Club, no armazém de José Maria Vasconcelos ou na quinta de Francisco Justiniano Marques, eram «recheados de infinita graça e animação com as melhores famílias da elite d’esta vila».
No Largo da Caldeira [actual Praça Gomes Freire de Andrade], as barracas de espectáculos ali instaladas aguardavam também por uma visita dos aldeanos.

Ruky Luky

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

De Bicicleta ou de Burro?


 
Ainda hoje, e todos os dias, um idoso casal atravessa as ruas da cidade a caminho da sua quinta localizada no Seixalinho, montado numa carroça puxada por uma mula, emprestando à cidade a imagem de um tempo que se julgava desaparecido. (R. Manuel Giraldes da Silva)
O tempo ainda convida ao passeio ao ar livre, os burros estão em vias de extinção e as bicicletas, numa cidade plana como Montijo, não são tão utilizadas quanto deveriam ser devido à falta de respeito dos automobilistas.
Há 115 anos, os aldeanos aguardavam pela noite, momento em que chegava de Lisboa o empregado de uma casa comercial que vinha a Aldegalega apresentar o novo meio de transporte e de diversão – a bicicleta. A quem a comprasse o empregado ensinava a «montar, pedalar e equilibrar». Na altura foram vendidas 10 bicicletas.
Porém, só no início do século vinte se organizarão as primeiras corridas de bicicletas, em Aldegalega do Ribatejo.
Em 21 de Janeiro de 1906, José Cipriano Salgado Júnior, Avelino Marques Contramestre, Aurélio João da Cruz e José Augusto Saloio fizeram a primeira ligação Aldeia Galega/Almada.

Em Setembro do mesmo ano, organizaram-se provas de ciclismo, voltando as notícias da modalidade em 1912. Em Agosto deste ano, o Aldegalense Sport Club organizou uma corrida de bicicleta e os cinco concorrentes cumpriram o seguinte percurso: Praça da República, Atalaia, Pocinho das Nascentes, R. da Fábrica e Praça da República.
A bicicleta veio para ficar e até à primeira metade do século XX serão organizadas competições de ciclismo, nomeadamente, no circuito Montijo, Samouco, Alcochete, Montijo.
Ah!, e o burro?
Ainda hoje, e todos os dias, um idoso casal atravessa as ruas da cidade a caminho da sua quinta localizada no Seixalinho, montado numa carroça puxada por uma mula.
E ainda hoje, se percorrermos algumas artérias da cidade, podemos descobrir uma ou outra velha habitação térrea com uma argola fixada na fachada principal, que servia para prender o jumento.
Mas o jumento não foi só animal de carga. No princípio do século vinte, organizavam-se disputadas competições (raides) com burros e animados passeios/pic-nics à Praia Branca com os participantes “a cavalo num burro”. Era um tempo em que os divertimentos desportivos englobavam também as corridas de púcaros, de botas, de fitas e negativas de bicicletas, corridas de saco e lutas de tracção.
A constituição do Aldegalense Foot-Ball Club ou Club Foot-Ball Aldegalense, em 1914, veio a constituir-se num marco na história do desporto em Aldegalega/Montijo – o futebol logrou conquistar o ceptro do desporto e passou a reinar até aos nossos dias.

Ruky Luky

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

O Pelourinho de Montijo

Em Busca do Pelourinho Perdido

No Largo limitado pela Igreja do Divino Espírito Santo e o Edifício António Pereira Duarte erguia-se o Pelourinho [Foto - 1906].
A existência, ou não, de um pelourinho, em Montijo, tem sido um facto arredado das preocupações de quem se interessa pela História deste Município, seja mero cidadão ou autarca.

A par do Foral de 15 de Setembro de 1514, dado por El-Rei D. Manuel I, Montijo, isto é, Aldeia Galega do Ribatejo, teve também um pelourinho, como indicia – não provará? – o ofício remetido pela Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Montijo à Comissão dos Arqueólogos Portugueses, em 1931.

Segundo o ofício «ficava o pelourinho num lugar apertado, onde prejudicava o trânsito, deixou de estar em frente do Edifício da Câmara Municipal, com a transferência deste, em 1816, para o novo lugar, que ainda hoje ocupa.»
De que local se tratará?
Acreditamos, pelas razões que passamos a expor, que é o actual Largo Pe. Gomes Pólvora, que se situa entre a Igreja do Divino Espírito Santo e o edifício de António Pereira Duarte.

O “Tombo 1 – Bens e Propriedades do Concelho principiado em 1721” regista, naquela data, «Duas casas térreas que estão no canto da rua da praça desta vila a que chamam Casa do Paço”, anotando que «Hoje possui João Pereira Duarte por compra que fez» e que, por isso, «Não deve estar no tombo por se ter vendido a casa.»
Estas casas foram demolidas e deram lugar ao edifício, hoje conhecido como de António Pereira Duarte, que ocupa toda a extensão da R. Almirante Cândido dos Reis ao Largo Padre Gomes Pólvora.
Alguns anos após a venda daquelas casas, a Câmara Municipal de Aldegalega passou a ocupar as “Casas Novas”, que ficaram conhecidas por “Paço”, e nelas funcionavam também o tribunal judicial e, no rés-do-chão, o mercado de peixe, carne, legumes demais géneros alimentícios.


Depois de ter vendido as suas casas a João Pereira Duarte, a Câmara Municpal de Aldegalega transferiu-se para este edifício, no início do século XIX. No primeiro andar funcionavam o Tribunal Judicial e a Câmara Municpal e, no rés-do-chão, o Mercado.[Foto 1906]
Eis alguns extractos do ofício:

«Levamos ao conhecimento de V.Ex.ª que não tem actualmente “Pelourinho” este Município. Não, porque ele tivesse sofrido a sanha inglória da fúria dos destruidores destes monumentos, mas porque, tendo sido arrancado pra mudança de lugar e ficando ao abandono indiferente de todos, sem que um novo lugar lhe fosse dado em qualquer praça da Vila, se partiu; perdendo-se, com o descuido a que foi votado, os seus restos.
A actual comissão administrativa da Câmara Municipal, (…) olha-o com apreço diferente.
Sente que a bela coluna salomónica era alguma coisa na sua rudez forte de marco de justiça.
Para o novo ano económico, pensa esta Comissão, adquirir um novo pelourinho, pois não lhe é indiferente – o que o pelourinho representa em qualquer terra – merecendo-lhe o mesmo cuidado que lhe mereceu os interesses do concelho.
(--------------------------------------------------------------------------------------------)
Ficava o pelourinho num lugar apertado, onde prejudicava o trânsito, deixou de estar em frente do Edifício da Câmara Municipal, com a transferência deste, em 1816, para o novo lugar, que ainda hoje ocupa.
(--------------------------------------------------------------------------------------------)
Procura a actual comissão administrativa honrar, com esta medida, os compromissos espirituais com as gerações passadas.»
As intenções eram boas, mas a obra não se concretizou.
Ruky Luky

 

domingo, 14 de outubro de 2012

Vamos ao Cinema?

Notícia do Animatógrafo em Montijo

Num armazém, que existiu no mesmo lugar onde hoje está um moderno edifício que alberga um stand de automóveis, na Rua José Joaquim Marques, foi instalado o primeiro animatógrafo de Aldeia Galega do Ribatejo.
No Natal de 1902, no Teatro Electro-Mágico, instalado no Largo da Caldeira, representou-se um espectáculo de fantoches articulados. Ao lado, numa modesta barraca denominada “Teatro Oriental”, subiram à cena os dramas “Os Dois Vadios” e “A Louca do Moinho”.
No dia 18 de Janeiro de 1903, estreou-se uma “comédia de animatógrafo” e no dia 25 do mesmo mês, “doze quadros de animatógrafo sobre a Vida de Cristo”, no Teatro Electro-Mágico.
   É a primeira notícia da apresentação da “fotografia animada” em Aldegalega embora seja provável que tenham sido exibidos, anteriormente, outros “quadros de animatógrafo”, visto que o primeiro espectáculo cinematográfico foi realizado no nosso País, em 18 de Junho de 1896, em Lisboa, no Real Coliseu, à Rua da Palma, no qual participou o actor aldeano Joaquim de Almeida, representando alguns monólogos. Atendendo à proximidade de Lisboa, aliada ao facto de Aldegalega ser um lugar de passagem obrigatório, é de presumir que as primeiras projecções tenham acontecido em anos anteriores, visto que os cinemas ambulantes e as barracas de feira desempenhavam então um papel primordial na divulgação do cinema.

Passou-se um ano sem notícias do animatógrafo, até que, em 28 de Fevereiro de 1904, João Luciano Postes solicitou uma licença na Secretaria da Câmara Municipal de Aldegalega para “armar uma barraca de animatógrafo”, no Largo da Caldeira, que se veio a chamar “Animatógrafo Lumiére”.
O armazém, como hoje o novo edifíco, tinha um outro portão na Rua Santos Oliveira [a carrinha identifica-o].
   
     Testemunhos da época garantem que “unicamente e com grande satisfação podemos acrescentar que é o mais claro e de movimentos mais naturais que temos visto, quer nas personagens quer nos objectos, que se apresentam em tamanho natural.
São de um efeito deslumbrante as transformações, prestidigitação, fantasmagoria e cenas de alta magia apresentadas em cores.
Há funções todas as noites e sempre variadas.”

O “Animatógrafo Lumiére” foi inaugurado no dia 17 de Abril desse ano e a última função realizou-se no dia 24 do mesmo mês com “ o excelente espectáculo, “A Pesca do Bacalhau”, película com 300m e tempo de exibição de 20 minutos.”
   Embora o cinema começasse a disputar os espaços que até então eram exclusivos do teatro e a ocupar armazéns, salas de conferências ou qualquer outro local com as condições mínimas para a projecção de filmes, em Aldegalega do Ribatejo o teatro, as operetas, as récitas populares e os espectáculos de variedades continuavam como fonte primeira de diversão e cultura populares. As barracas de animatógrafo instalavam-se por brevíssimas temporadas no Largo da Caldeira [Praça Gomes Freire de Andrade] e logo partiam em busca de novos horizontes.


O espectáculo era misto, porque  a emancipação do cinema foi gradual. Aqui, a voz do "Rouxinol Humano", Amparito Vals, a melhor cantadeira de fados, intercalava com a projecção das fitas, que eram acompanhadas ao piano.
     No início de 1907, correu a notícia que “o sr. Artur Carlos Costa, proprietário da Eléctrica, brevemente apresentará no teatro desta vila, em diversas sessões, quadros de fotografia animada e, por isso, com ansiedade esperamos a sua realização para passarmos algum tempo esquecidos da monótona vida que levamos.”
    O sonho de Artur Costa não se realizou, mas, no final do ano, anunciava-se que “no dia 16 de Novembro, Aldegalega tem ocasião de admirar o mais perfeito animatógrafo até hoje conhecido no País. Na realidade, uma sociedade constituída por aldeanos resolvera “comprar, em Paris, uns aparelhos para o animatógrafo, que será montado no teatro desta vila”, à Rua da Fábrica [Rua José Joaquim Marques]. Porém, devido ao atraso na entrega dos aparelhos, António Máximo Ventura, um dos sócios, contratou “The Wonderful”, o animatógrafo que fizera a estação de Verão, com enorme sucesso, no Jardim de Inverno do Teatro Dª Amélia, em Lisboa. As sessões inauguraram-se, no dia 8 de Dezembro de 1907, e todas as noites apresentavam-se “quadros grandiosos, o que tem dado lugar a que o vasto salão se torne pequeno para acomodar tão grande número de espectadores.”

O primeiro animatógrafo foi inaugurado finalmente no dia 23 de Fevereiro de 1908 e era propriedade “de uma empresa composta por indivíduos desta vila, que resolveu dar espectáculos para assim termos um bom passatempo. E Empresa do Salão Animatógrafo adquiriu o último modelo em aparelho animatógrafo, sendo o seu autor o célebre engenheiro francês Gaumon, e também o grande fonógrafo “Pathé”, que está reconhecido como o melhor do género.”
O Salão Animatógrafo passou a denominar-se Teatro Recreio Popular e situava-se num armazém na Rua da Fábrica.

Este armazém propriedade de José Maria de Vasconcelos, acabou por se transformar numa das primeiras salas de espectáculos de Aldegalega, quando, em 1904, a Troupe do Teatro Popular, que apresentava os seus espectáculos num elegante teatro barraca montado no Largo da Caldeira (Praça Gomes Freire de Andrade), ali se refugiou para fugir das intempéries de um Inverno excessivamente rigoroso. Devido ao êxito que alcançou, a companhia prolongou a sua estada em Aldegalega e o armazém passou a ser conhecido como “Salão Recreio Popular”. Por iniciativa de António Máximo Ventura foi remodelado e adaptado definitivamente a Salão Teatro e inaugurado no dia 8 de Outubro de 1905.
 
«Só para ver este belo quadro merecia gastar o dobro». Mas, ainda assim, «Preços do costume».
 
  Ao referir-se ao animatógrafo, o jornal “O Domingo”, em 1908, realçava que o animatógrafo “é uma boa distracção ao alcance de todas as bolsas e que é de boa justiça que o público concorra para assim evitar que até isso deixe de existir, (visto que) é o único recreio que esta terra possui.”
     Não havia, afinal, razões, para qualquer receio porque o mesmo jornal reconhecia, algum tempo depois, que “o animatógrafo continua a ser muito concorrido.”

   O cinema passava a ser o principal recreio dos aldeanos. Havia duas funções, uma às 19H00 e a outra às 21H00. Quem assistisse à primeira podia ficar para a segunda sem que para isso tivesse de pagar mais. A crítica afiançava: “Temos assistido a este género de espectáculos e com franqueza o dizemos, ainda não vimos melhor. É o que há de mais perfeito em fotografia animada.”

Ruky Luky
 

terça-feira, 9 de outubro de 2012

As Bandeiras da Santa Casa da Misericórdia de Aldeia Galega do Ribatejo/Montijo [Séc. XX – XXI]

2. A Bandeira Actual

Bandeira aprovada pela Irmandade, na década de 30. Desconhece-se o paradeiro ou, mesmo, se terá sido estampada.

Em 30 de Outubro de 1931, a Mesa da Santa Casa da Misericórdia de Montijo deliberou pedir à Associação dos Arqueólogos Portugueses que a informasse qual o emblema e a bandeira que deveria usar «visto não possuir bandeira e o selo branco estar antiquado.»

A Misericórdia utilizava o seu antigo painel, de difícil execução e que não tinha sido criado para ser hasteado num mastro fixo e, até à implantação da república, usara o selo criado em 1768, que já se não adaptava aos novos tempos políticos porque reproduzia as armas reais.

Bandeira da Misericórdia como se conheceu.São patentes as alterações no escudo se comparadas com o original. O azul e o branco eram as cores dominantes das peças.
 Em 1928, Afonso de Dornelas, membro da Associação dos Arqueólogos Portugueses, defendeu a criação de uma nova bandeira para as Misericórdias, na qual figurassem os principais factos da sua história e da sua vida, sugerindo que a cruz e a caveira fossem aproveitadas para significar a acção da instituição, a cruz como símbolo de fé para os que vivem sofrendo e as tíbias e a caveira como símbolo de protecção até à morte.

O parecer de Afonso de Dornelas foi presente à secção de Heráldica da Associação dos Arqueólogos Portugueses, que o aprovou na reunião de 4 de Maio de 1932.

Pin com a reprodução das cores da bandeira.
 Nos termos do parecer, o brasão das Misericórdias devia ser constituído pela aspa do timbre de armas da Família Conteiras, a que pertencia Frei Miguel, de azul orlada de ouro, acompanhada em chefe por uma cruz alta de ouro com raios de prata e em ponta por uma caveira de prata encimando duas tíbias do mesmo metal, cruzadas em aspa.
A mesma cruz acompanhada lateralmente pelo camaroeiro de ouro, emblema da Rainha D. Leonor, e pela esfera armilar, do mesmo metal, emblema do rei D. Manuel.
A bandeira devia ser preta, por ser esta a cor heráldica representativa da modéstia, humildade e compaixão.
A aspa azul, além de ser a cor própria, heraldicamente adoptada para timbre das armas da família Contreiras, significa ainda zelo, caridade e lealdade.
O ouro para orla da aspa e para esmalte do camaroeiro, da esfera e da cruz alta significa heraldicamente a fé, a constância, o poder e a liberalidade.

Selo. Século XVIII
A Santa Casa da Misericórdia de Montijo foi uma das poucas Irmandades que aceitou o projecto, passando o Artigo 2.º do seu Compromisso a estipular que: «A Irmandade continua a ter por insígnia a bandeira da Misericórdia bem como emblema, para ser usado como selo branco e no timbre dos seus documentos, o que foi aprovado pela Secção Heráldica da Associação dos Arqueólogos Portugueses em 4 de Maio de 1932 (…)».

Desconhece-se se, na altura, a Irmandade mandou estampar a sua nova bandeira, embora tivesse mandado cunhar o novo selo.


Selo.Século XX, respeitando a descrição aprovada.
Por razões que se desconhecem, a bandeira que se passou a ser usada fora estampada com as peças e a cor adulteradas, nomeadamente, o camaroeiro. O azul e o branco passaram a ser as cores dominantes.
A Assembleia Geral da Santa Casa da Misericórdia de Montijo, realizada em 17 de Março de 2012, aprovou a nova bandeira, dando corpo à proposta de José Manuel Pedroso da Silva, concretizada por José Sesifredo Estevéns Colaço.

Estandarte actual

 
Armas – Em escudo de púrpura, uma pomba estendida de prata coroada de ouro e uma vieira de ouro, uma sobre a outra.

Num listel de prata, ondulado, sotoposto ao escudo, em letras maiúsculas a negro, de estilo elzevir, SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE MONTIJO.

Este ordenamento assenta sobre uma aspa de azul. Coroa mariana de ouro.

Estandarte –  De prata, com aspa firmada de azul. Escudo circular de púrpura, uma pomba estendida de prata coroada de ouro e uma vieira de ouro, uma sobre a outra, brocante, tudo envolvido num listel circular de prata, com a inscrição SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE MONTIJO, em letras de negro, maiúsculas, de estilo elzevir.

Bordadura de púrpura, acantonada de ouro, com as seguintes cargas: I e IV: monograma «MI ZA» de vermelho; II: estrela de sete raios de vermelho; III: rosa de sete pétalas de vermelho, folhada de verde e abotoada de ouro.

Haste e lança de ouro, cordão e borlas de prata e azul.


Simbologia
A Pomba  –  representação milenária do Espírito Santo, é o símbolo universal da Paz e dos tempos novos da aliança dos homens com Deus. Recorda, para além da antiga Freguesia do Divino Espírito Santo de Aldeia Galega do Ribatejo, a Albergaria e Hospital do Espírito Santo, já documentado em 1489, e anexada pela Misericórdia, com base numa carta régia de D. Sebastião, datada de 13 de Outubro de 1574.
A Vieira  alude à Ordem de Sant’Iago, fixada definitivamente nesta zona, concretamente no Convento de Palmela, no ano de 1482.
A Coroa Mariana  –  afirma a protecção e realeza de Nossa Senhora
A Aspa  –  alude ao timbre das armas atribuídas à família de Frei Miguel Contreiras, tido por fundador das Misericórdias.
O Monograma MI ZA –  constitui tradição da heráldica das misericórdias.
A Estrela de sete pontas –  refere-se às sete obras de Misericórdia espirituais.
A Rosa de sete pétalas  –  refere-se às sete obras de Misericórdia temporais.
Os esmaltes significam:
O ouro  –  vigor.
A prata  –  verdade.
O azul  –  integridade.
A púrpura –  dignidade.

 

Ruky Luky

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Assim Moldava o Cobre

José Cabrita, Caldeireiro

Assim moldava o cobre, José Cabrita, recorrendo a estes instrumentos
A partir de uma dada medida, mas sem molde, com o martelo e a bigorna, o maço e a palanca, a estaca e a «burra» (cavalete) e com uma enorme sabedoria, foi dando forma às peças, pancada após pancada.


Alambiques, caldeiras, panelas, tachos e tantos outros objectos utilitários que depois, com o decorrer do tempo e a mudança dos usos, se transformaram em decorativos, saíram das suas mãos, para apetrechar empresas ou embelezar lares.


Aprendeu o ofício com o seu pai, no Algarve, donde partiu, há cerca de sessenta anos, para o Montijo, tantos quantos tem a sua oficina, instalada num velho armazém da Rua José Joaquim Marques [Estrada Nova].

José Cabrita nasceu em 8 de Janeiro de 1923. Apesar de ter legado os seus conhecimentos ao filho, que não trabalha na sua oficina, é o derradeiro caldeireiro de Montijo.
Ali, já se não ouvem as pancadas cadenciadas do martelo sobre o cobre, nem se divisam exemplos das grandes peças que um dia moldou. A oficina é, hoje, um repositório de recordações guardadas, em exclusivo, na sua memória, e que vai partilhando na conversa que flui lenta, ao sabor da viagem a um passado de trabalho.

 
Não há, em Montijo, uma tradição deste ofício. Há notícias, escassas de um ou outro caldeireiro que se instalou, por breve tempo, na velha Aldeia Galega, mormente, uma família húngara.


Encerrada a oficina de José Cabrita concluir-se-á o capítulo deste ofício na história de Montijo, que, hoje, o cobre é moldado de modo industrial.


Quem tem uma peça saída daquela oficina sabe que é única. Conserve-a!

 
Ruky Luky

 

 

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

O Conjunto Edificado do Pátio de Água

A Casa de Santos Fernandes

Quinta do Casado, que depois se apelidou de Quinta do Páteo d'Agua, foi, posteriormente, casa do Comandante Santos Fernandes e é, hoje, a sede da Junta de Freguesia de Montijo.
 
No século XVIII, Aldeia Galega do Ribatejo contava ainda, entre os seus habitantes, «pessoas nobres e ricas e deveu a muitas delas a edificação de casas e de boas quintas, de que as principais eram: a da Graça, dos frades agostinhos; a da Casado (hoje Páteo d’Agua); a das Postas; a do morgado Saldanha da Gama; a de D. Francisca de Sousa (hoje denominada Caneira) (…)», como escreveu José de Sousa Rama.
Sobre as antigas edificações da Quinta do Casado, o Comandante Santos Fernandes, oficial da Marinha e administrador da Companhia Agrícola do Cassequel [Catumbela/Angola] ergueu a sua casa.
É um projecto do arquitecto Porfírio Pardal Monteiro, que acabou por ser concretizado nas décadas de 40/50 do século XX.
O edifico localizado na Avenida dos Pescadores, e que tem adossada uma capela, torna-se notado pela volumetria e distingue-se pelos telhados com beirais e mansardas, pelas floreiras a pontuar as janelas com adufas e, no interior, pelos tectos
 de madeiras exóticas e pelos lambris de azulejo que cobrem a generalidade das divisões.
No edifício e na capela são dignos de realce os vitrais da autoria de Ricardo Leone.

 
 
 
 
 
 
Sala de sessões da Assembleia de Freguesia de Montijo
 
 
 
 
 
 



 
 
 
 
 
 
 
 
Ruky Luky