sábado, 6 de setembro de 2014

A Feira do Porco 2014


ACÁCIO DORES, A MONTIAGRI
E A FEIRA DO PORCO

A 22.ª Feira Nacional do Porco decorrerá, em Montijo, entre os dias 26 a 28 de Setembro, no recinto da Montiagri

A 22.ª Feira Nacional do Porco decorrerá, em Montijo, entre os dias 26 a 28 de Setembro, no recinto da Montiagri, também denominado Centro de Exposições (Acácio Dores?). Ainda não houve grandeza dos autarcas para isso.

Segundo a Federação Portuguesa de Associações de Suinicultores (FPAS), entidade organizadora, «a edição deste evento reunirá no Montijo toda a fileira da carne de porco, desde a produção de alimentos compostos para animais até à indústria de abate e transformação, passando pela produção e actividades afins (genética, consultoria, laboratórios de análise, fabricantes e distribuidores de produtos médico-profiláticos, projetistas, fabricantes de equipamentos, etc).»

A FPAS regista a rápida adesão das mais importantes empresas sector o que permitiu que em quatro semanas se tenha esgotado a capacidade do “Pavilhão Profissional”.

A Feira do Porco foi instituída, em 1986, pela Câmara Municipal de Montijo em colaboração com a FPAS.
Com a realização da feira, o executivo de coligação PS/PSD, liderado por aquele partido, punha termo à Montiagri- Feira Industrial, Comercial e Agro-pecuária de Montijo, optando pela especialização do evento.

Esclarecia a autarquia que «a feira, sob a liderança de Mendonça Tavares, Presidente da Comissão Executiva, será específica do porco e abrange todos os aspectos técnicos inerentes ao seu ciclo de produção, comercialização, industrialização, consumo e, consequentemente, à sua manutenção higiénico-sanitária.»

A FPAS regista a rápida adesão das mais importantes empresas sector o que permitiu que em quatro semanas se tenha esgotado a capacidade do “Pavilhão Profissional”.
Desde então, a Montiagri tem hospedado regularmente a Feira Nacional do Porco, isto é, a Feira do Nacional do Porco realiza-se, em Montijo, porque existe o recinto da Montiagri e devido ao empenho inicial de Mendonça Tavares e Primo Jaleco, então Presidente da Câmara Municipal.

O recinto da Montiagri patenteia, hoje, uma pálida ideia do que foi.
Após 17 anos de gestão socialista, o recinto foi transformado em local de armazenamento de sucata e de oficina municipal, sem qualquer resguardo ou projecto para a sua adaptação às novas funções. E tão degradado está o recinto, que a Feira do Porco já correu sérios riscos de ali se não realizar.

O PS começou por ser um estrénuo crítico da realização da Montiagri, mas acabou por revelar que, afinal, não tinha qualquer projecto para aquele recinto – nem para o Concelho.

Foi na reunião da Câmara Municipal de Montijo, de 17 de Setembro de 1980, que Acácio Dores, então Presidente da Câmara Municipal, apresentou a proposta da empresa ARTISOM para a realização de uma grande mostra das actividades industriais, comerciais, agrícolas e pecuárias do concelho, a concretizar-se, pela primeira, no ano seguinte.

A proposta, que tinha por suporte «as elevadas potencialidades económicas do concelho e a projeção que uma grande feira poderá dar ao nome de Montijo, tanto a nível nacional como internacional», foi aprovada com os votos favoráveis da APU e do PSD e a abstenção do PS.

Na mesma reunião, foi nomeada uma Comissão Executiva, constituída pelo vereador em regime de permanência, Eng.º Rogério Cordeiro, pelo Chefe dos Serviços Técnicos, Eng.º Maldonado Pires; pelo Tesoureiro Municipal, senhor Custódio Moreira e pelo Chefe dos Serviços de Higiene e Limpeza, senhor Manuel Mourato.

Em comunicado à população, a câmara municipal elucidava que «Para demonstração cabal e expressiva das verdadeiras potencialidades do nosso concelho, da capacidade de iniciativa e espírito empreendedores dos seus naturais, vai realizar-se, por iniciativa desta Câmara, de 17 a 28 de Setembro do próximo ano, a MONTIAGRI/81 – 1.ª Feira Industrial, Comercial e Agropecuária do Montijo, que constituirá uma verdadeira mostra das actividades laborais da região.
Pretende-se assim demonstrar, pela projecção que se pretende ar à MONTIAGRI/81, o Montijo de hoje – o Montijo moderno, industrializado e já com um grande peso na economia nacional, em suma, o verdadeiro Montijo.»

Para a edificação da feira, previa-se, então, um investimento de 10 164 093$00 e uma receita de 4 045 900$, sendo os investimentos recuperáveis no valor de 8 235 690$00, donde resultaria um saldo positivo de 1 977 403$00.

Inicialmente, a instalação da feira esteve prevista para um terreno com cerca de 1,5ha localizado no topo norte da Avenida Luís de Camões, mas a câmara municipal acabou por adquirir outro, junto à Praça de Touros, com 4 ha, onde efectivamente se construiu a feira.
A aquisição daquele terreno consolidou a ideia da realização da 1.ª Feira Industrial, Comercial e Agropecuária de Montijo, e, por outro lado, dotou o local de infra-estruturas, que se revelaram úteis a realizações futuras, mormente, à chamada «Feira da Ervilha.»

A MONTIAGRI/81, em si, acabou por ocupar uma área total de exposição de cerca de 34.00 m2, que acolheu 140 stands cobertos, uma área coberta com cerca de 1.800 m2, onde foram implantados 64 stands, um pavilhão para exposição de animais e toda a gama de produtos de alimentação e apoio médico-sanitário à pecuária e cerca de 5.000 m2 ao ar livre, para maquinaria pesada (máquinas e alfaias agrícolas, camiões, empilhadores, etc.), cerâmica e pré-fabricados. A área livre da feira, composta por arruamentos e zonas verdes ocupava cerva de 16 576m2.
A feira dispunha de serviços de apoio, mormente, de Secretariado, do Posto dos CTT, Sala de Colóquios, Restaurante e Bar.

Ultrapassando as melhores expectativas, a Montiagri – 1.ª Feira Industrial, Comercial e Agropecuária de Montijo, a única no género no Distrito de Setúbal, como reconheceu o Governador Civil, recebeu 157 expositores, representando actividades tão diversas como a agro-pecuária, a cortiça, serviços, material para a agricultura, mobiliário e decoração, construção civil e indústrias diversas, e 60.000 visitantes.


«A MONTIAGRI/81 passou por esta terra como um furacão. Desencadeou aplausos, júbilos, euforias, dúvidas, críticas, despeitos, invejas, frustrações, ataques por vezes violentos, louvores por vezes desmedidos. Atirar uma pedra no charco levanta sempre muitas ondas. Nas margens serenas do anonimato e da inércia algumas plantas mais frágeis e delicadas vergam ao insólito do vendaval inesperado, por desusado.»

O anúncio da realização da feira deu azo a um acalorado debate, em Montijo.

Augusto Barbosa, que o assinou com o pseudónimo Aldeano, defendeu, nas páginas da Gazeta do Sul, que a MONTIAGRI vinha com um atraso de 20, de 30 ou 40 anos, e que «a or-­ganização de uma Feira-Exposição nos moldes em que se anuncia a MONTIA­GRI/81 devia ter-se proces­sado a partir do momento em que Montijo começou, efectivamente, a pesar na balança económica do País pelas suas realizações em vários sectores, dos quais se destacam, como sabe­mos, as carnes, a cortiça, a cerâmica, etc.»

Por outro lado, reconhecia que «as exposições, do género da Montiagri não se costumam fazer apenas para mostrar que as coisas existem, que os industriais estão cá, que as empresas atingiram já, algumas,um desenvolvimento notável, mesmo de nível CEE — caso Isidoro — etc., mas devem traduzir uma finalidade  ­útil que se desdobra, pelo menos, em duas direcções: a de permitir uma «informação» viva e actuante sobre os sectores em exposição, e a de conseguir, pelo conhecimento mútuo, a abertura de novos horizontes a uma colaboração que, por um lado, se impõe nos modernos rumos da actividade económica e, por outro, económica e, por outro lado, pode resul­tar num dado de importância para o crescimento económico das actividades in­teressadas e da região em que as mesmas se implantam.»

E concluía o articulista: «Parece-me ne­cessário e conveniente que esta realização, importante e significativa, seja encara­da como «realização co­mum», como mostra colec­tiva das potencialidades do concelho, e nela se não venham a encontrar quais­quer motivos que por isto ou por aquilo se prestem à especulação política, em que somos danados.
O que se torna imperioso, e útil, é que realizações des­te tipo façam escola, e se repitam, na condição de que, real e efectivamente, se repercutam como acções dinamizadoras tendo em vista o crescimento, não apenas do PIB, mas do bem-estar da comunidade. Que é coisa diferente do mero crescimento da eco­nomia.»

Os propósitos enumerados por Augusto Barbosa acompanhavam os princípios e os trilhos que a realização da Montiagri previa seguir, porque, como declarou o seu instituidor, Acácio Dores: «A MONTIAGRI ­existe porque convicta e honestamente pensámos que a valia do nos­so concelho no quadro da economia portuguesa legitimaria a existência duma feira em Montijo e que es­sa feira poderia ser um instrumento muito útil para um maior robustecimento e expansão das actividades económicas do concelho, com todos os benefícios daí advenientes para os traba­lhadores e empresas. Sem­pre pensámos que não devia haver qualquer divórcio entre a Autarquia e os agentes económicos e que a MONTIAGRI poderia ser exactamente a ponte entre as duas partes. É evidente que sem a cooperação dos empresários montijenses dificilmente a MONTIAGRI poderá vir a ser o instru­mento que idealizámos. Ca­berá aos nossos empresá­rios reflectirem e imbuírem-se de espírito cooperante para que as suas empresas possam ter a dinâmica e o progresso consonantes com os seus próprios interes­ses.»

A realização da MONTIAGRI/81 não foi também um acontecimento pacífico.

«Por razões até curiosamente contraditórias, a iniciativa não concita a opinião favorável da unanimidade dos nossos conterrâneos. Uns vêem nela uma manobra de oportunismo político, porventura de sinal conservador e pendor capitalista; outros uma forma de despender o já tão escasso dinheiro municipal, senão inutilmente pelo menos com prejuízo de outras obras mais necessárias para a população; e há ainda quem a critique depreciativamente sem qualquer razão, só porque ela existe.
Mas a divergência de opiniões, salutar e encorajadora, sobretudo quando aceite de consciência tranquila, como um desafio que se assume em prol da comunidade.» Reconhecia, assim, Acácio Dores o percurso da Montiagri, em vésperas do acto inaugural.

Entre as vozes polémicas que se levantaram contra a realização da Montiagri avultou a do Partido Socialista, que afirmou: «Embora se considere interessante a iniciativa de criar no Montijo uma feira agro-industrial (Montiagri), consideramos que as condições financeiras do Município não nos permitem satisfazer, ao mesmo tempo, determinados caprichos, próprios de uma administração de direita ou liberal, e completar as infra-estruturas primárias dos bairros da periferia da Vila e zonas rurais.

Em comunicado, reforçava as suas críticas afirmando que «O Partido Socialista considera que a maioria APU na Câmara, em colaboração com as forças de direita, investiu dezenas de milhares de contos, em prejuízo das populações mais carenciadas. Estamos certos que a estratégia seguida pela A.P.U., em colaboração com a direita democrática, não vai ao encontro das primeiras necessidades do concelho, pelo que a sua conduta não pode merecer o apoio das classes trabalhadoras.»

Porém, face ao êxito que se adivinhava, os socialistas, pela pena do seu presidente concelhio, José Bastos, emendaram o discurso e reconheceram que: «Nós socialistas não desconhecíamos que a Montiagri ia ser um êxito, pois conhecemos bem as potencialidades do concelho, isto é tanto verdade, que fomos nós que alvitrámos que a feira se fizesse naquele local, quando o Sr. Presidente nos propôs um outro local com menos de 1,5ha.(…).
Tínhamos dúvidas isso sim, era se tudo ficaria pronto a tempo da feira funcionar em Setembro, o que foi conseguido graças à vontade política tanto do Sr. Presidente da Câmara, como dos seus colaboradores mais próximos. (…).
Agora que a feira é um facto consumado e o dinheiro está gasto, julgamos que a feira tem que continuar, pois constitui um factor de progresso para as actividades económicas do nosso concelho.»

Isto é, a Montiagri passara a ser encarada pelos socialistas como « factor de progresso para as actividades económicas do nosso concelho.»

A MONTIAGRI, se agitou de um modo são o tecido social e económico do concelho, perturbou vivamente as mentes mais conservadoras e paroquianas, que se atemorizaram com a inovação e a grandeza do projecto idealizado  e concretizado por um comunista, porque vinha baralhar a aritmética eleitoral, atendendo à boa recepção da população em geral.

Isto mesmo confessava o presidente da comissão política do PS de Montijo: «Para sermos francos temos que dizer que não compreendemos a razão da opção do Sr. Presidente da Câmara, que sendo de filiação partidária comunista, entusiasmou-se por um projecto que nem de perto nem de longe se coaduna com a ideologia do seu partido, defesa das classes mais desfavorecidas.»

Do lado social-democrata levantou-se a voz de José Henrique Cardoso para quem a MONTIAGRI foi «brilhante e lamentável, um atentado aos direitos dos cidadãos. Como industrial sinto-me encantado, como munícipe e autarca estou absolutamente contra.»

Opinião diferente expressou o empresário Manuel Paiva: «Só tenho a louvar esta bela iniciativa. Congratulo-me como comerciante e sobretudo como montijense que sou, por tão louvável empreendimento.
Foi uma ideia arrojada, direi até atrevida – passe o termo – mas que beneficiou todos os habitantes, mas principalmente os comerciantes da minha terra.
Sinto-me regozijado e volto a louvar a audácia e a coragem desse homem que meteu ombros à melhor coisa que aconteceu no Montijo nos últimos anos.
A Montiagri chegou na hora exacta e é uma realidade de que todo montijense se deve orgulhar.»

Entre a saudável polémica e o aplauso popular, o jornal Gazeta do Sul endereçava os parabéns ao «Presidente da Câmara do Montijo, Sr. Acácio Dores, o principal impulsionador desta realização. Conseguiu, em nosso entender, o objectivo principal a que se propunha a Montiagri/81 – revelar toda uma potencialidade económica do Concelho.
Pode dizer-se que a Feira partiu do nada para chegar a esta imponência que está diante dos nossos olhos.»

Anos mais tais tarde, ao ser entrevistado, Acácio Dores reconheceu:
«Há uma obra feita no meu mandato que me deixa satisfeito: a Montiagri, feira agro-pecuária, comercial e industrial do Montijo.
Foi idealizada e construída neste mandato, houve que fazer toda a rede de saneamento e os arranjos em volta. A feira foi inaugurada em 1981 e convidámos para presidir à cerimónia o então Presidente da República, António Ramalho Eanes. Ele não quis vir à inauguração mas foi visitá-la mais tarde. Acho que foi o primeiro Presidente da República a visitar o Montijo.
A Montiagri foi uma ‘pedrada no charco’. Na altura eram poucas as localidades com feiras deste género e nós apostámos naquele pólo de desenvolvimento porque fazia falta num concelho com grande importância ao nível da cortiça, da agricultura, da suinicultura, da transformação de carnes, da cerâmica de barro vermelho, e do fabrico do pré-esforçado.
 Foi uma obra bastante importante e a prova disso é o facto da Montiagri continuar a ser, nos dias de hoje [2002], um ponto de referência nacional.»

A pena brilhante do Dr. Avelino da Rocha Barbosa, que tão cáustica tinha sido para com a Montiagri, sintetizou, assim, o evento:

«A MONTIAGRI/81 passou por esta terra como um furacão. Desencadeou aplausos, júbilos, euforias, dúvidas, críticas, despeitos, invejas, frustrações, ataques por vezes violentos, louvores por vezes desmedidos. Atirar uma pedra no charco levanta sempre muitas ondas. Nas margens serenas do anonimato e da inércia algumas plantas mais frágeis e delicadas vergam ao insólito do vendaval inesperado, por desusado.»

Hoje, o Montijo tem um recinto, que custou cerca de 150 mil euros, capaz para receber condignamente os mais diversos eventos, assim alcancem competência os nossos autarcas.

Um dia, um Homem agigantou-se e a Montiagri ergueu-se. Grande demais para alguns pigmeus que depois a tomaram.

Obrigado, senhor Acácio Artur Soeiro Dores.

A nossa simples homenagem no 1.º aniversário do seu passamento.

Ruky Luky


terça-feira, 2 de setembro de 2014

D. Manuel I e o Montijo (4)


A Corte na Aldeia Galega do Ribatejo



Terá D. Manuel I aceitado o pedido de um pescador para ser juiz perpétuo do Círio dos Pescadores de Aldeia Galega do Ribatejo?
O Padre Manuel Frederico Ribeiro da Costa, Capelão que foi da Atalaia, no seu livro “Narrativa Histórica da Imagem de Nossa Senhora da Atalaya que se venera na capella sita no monte d’Atalaya do concelho de Aldeagallega do Ribatejo”, editado em 1887, ao reportar-se ao Círio dos Pescadores de Aldeagallega, narra o seguinte episódio:

«A origem deste círio remonta aos tempos do reinado de D. Manuel, segundo antiquíssima tradição que voga entre os pescadores desta vila.
Contam eles – com alguma ufania – que, aportando o rei D. Manoel e seu séquito em uma galeota ao porto desta vila, com o intuito de uma excursão ao Alentejo, sucedera por motivo da vazante da maré, dar em seco a régia embarcação e achar-se nessa ocasião próximo um pescador entregue à lida da sua arte.
Os régios viajantes, precisando desembaraçarem-se deste inesperado encalhe, chamaram o pescador a fim de os transportar para terra.»

Segundo a tradição guardada pelo capelão da Atalaia, o pescador transportou o rei às costas e quando o monarca lhe perguntou quanto queria em remuneração pelo seu serviço terá respondido: «que o maior benefício que el-rei lhe podia dispensar era ser juiz perpétuo do círio dos pescadores de Nossa Senhora da Atalaia, sua terra».

O Padre Manuel Frederico Ribeiro da Costa sustentou que não tinha dúvidas de que D. Manuel I fora juiz perpétuo dos Cirio dos Pescadores de Aldegalega, escorando-se nos seguintes factos: a) A existência, na sacristia da Igreja da Atalaia, de uma caixa do círio dos pescadores com o rótulo “S.º D. N. S. DaTa El-Rei D. Manoel juiz Propria. D. festa Dos Pescadores Dalda Ga e todos mas Res 1534”; b) A antiga prática da Câmara de Aldegalega de satisfazer a esmola do sermão da festa do mesmo círio, devido à vontade expressa de D. Manuel, ou em homenagem a tão pia tradição; c) O uso muito antigo de se inscrever e ler-se, na ocasião da festividade, na eleição dos mordomos festeiros, como juiz perpétuo, o nome do monarca reinante; e c) A bandeira real do círio, que indicia uma vetusta protecção régia.
Mas serão estas razões suficientes para provarem que o Rei Venturoso passou por Aldegalega do Ribatejo e correspondendo ao pedido de um pescador aceitou ser Juiz perpétuo do Círio dos Pescadores de Aldegalega?

O Capelão da Atalaia socorre-se de «antiquíssima tradição» para evocar a passagem de D. Manuel por terras aldeanas, mas só pôde afiançar que não tinha dúvidas de que D. Manuel I fora juiz perpétuo dos Cirio dos Pescadores de Aldegalega, embora reconhecesse que «a origem (do Círio dos Pescadores) remonta aos tempos de D. Manuel, ou que já no reinado de D. Manuel concorria este círio à Atalaia.»

Contudo não há documentos que provem a passagem do rei por terras de Aldeia Galega do Ribatejo.
Se consultarmos a itinerância do rei, durante o seu reinado, podemos confirmar que em 1496 passou por Alcochete; em 1500 por Alcácer e Setúbal; em 1508, voltou a passar por Alcochete; e naquele ano e no ano seguinte esteve em Évora. Em Évora se regista a passagem do monarca nos anos de 1512, 1513, 1519 e 1521, e neste ano passou também pelo Barreiro. A real itinerância não regista a passagem por Aldeia Galega do Ribatejo.
Mas como Aldeia Galega do Ribatejo era na altura renomado porto de acesso ao sul do País para quem viesse de Lisboa poderá indiciar a passagem do monarca numa das suas deslocações ao Alentejo, embora não haja regsitos.
Mero indício, que a tradição afirma, mas a História não confirma.

Membros da ilustre família Cotrim descansam eternamente na Ermida de Nossa Senhora da Piedade, em Sarilhos Grandes.

Mas a “presença” de El-Rei, em Aldeia Galega do Ribatejo, é revelada por outros testemunhos.

Um será a outorga do foral, em 15 de Setembro de 1514, os outros apontam para a presença de fidalgos da sua Casa, nomeadamente, da ilustre família Cotrim, em terras aldeanas.

Em Sarilhos Grandes, adossada à Igreja de S. Jorge, existe uma capela funerária manuelina mandada edificar por João Cotrim, no início do séc. XVI.
Presume-se que o Doutor João Cotrim seja filho de Ruy Cotrim de Castanheda.

Esclarece Joaquim Baldrico que o «Doutor João Cotrim (foi) personagem importante no reinado do Rei Venturoso, uma vez que, entre os vários cargos que desempenhou, foi Corregedor dos Feitos Crimes da Corte, Desembargador do Agravo da Casa da Suplicação e membro da Comissão de Revisão das Ordenações e da reforma dos Forais.»

Ruy Cotrim de Castanheda, fidalgo da Casa de D. Manuel, pelejou no Norte de África, foi capitão das armadas de Vasco da Gama e de Pedro Álvares Cabral, à Índia, e uchão da Casa Real.

No interior da Ermida de Nossa Senhora da Piedade, assim se denomina a capela, há duas sepulturas: uma com inscrições imperceptíveis e a outra, diante do altar, que atesta a importância da personalidade, com uma inscrição em letra gótica. Aquela será a sepultura do Doutor João Cotrim, esta certifica que:  
«AQVI IAS RUY CUTRIM DE CASTANHEIRA FIDALGO DA CASA DE ELREI DÕ MANVEL I».

Estes ilustres fidalgos escolheram Aldeia Galega do Ribatejo para o seu descanso eterno.
Gente ilustre que participou na gesta dos Descobrimentos e na Administração Manuelina está entre nós, enriquecendo-nos com o seu legado.

Mas Montijo revela-se tão pobre que não alcança a grandeza de tal presença.

Ruky Luky

P.S. Um outro Cotrim jaz na Igreja de S. Jorge (sarilhos Grandes), mas será tema para uma futura publicação.