sábado, 30 de novembro de 2013

Uma Viagem ao Passado (2)

 O Bairro da Cadeia
Aspecto da Praça da Republica,  em 1961 

À medida que a população se foi deslocando para o centro da vila e se construiu o “porto novo”, o “pequeno rossio”, que era então a actual Praça da República, tornou-se, paulatinamente, no centro de Aldegalega do Ribatejo.

No século XIX, a praça, além da Igreja do Divino Espírito Santo, era ladeada, a poente, pela cadeia e um conjunto de casas nobres e, a sul, pela Estalagem das Caleças (antiga Fábrica TÓBOM). Ao conjunto edificado da cadeia e das casas nobres, que corresponde hoje ao espaço ocupado pelo Banco Santander Totta até ao antigo Centro de Convívio de Reformados, denominava-se Bairro da Cadeia. Entre o Bairro da Cadeia e o actual Mercado Municipal, encontrava-se o açougue e a eira pública.

A Praça era o local privilegiado para a realização de festas, de cunho sagrado ou profano, como as festas do Divino Espírito Santo e de outras confrarias, e para a realização de mercados.
Em 1839, estabeleceu-se o mercado das hortaliças e, prosperando também o mercado suinícola, a Câmara Municipal de Aldegalega deliberou proibir que “os porcos fossem expostos ou demorados nos sítios da Praça, Cadeia e Caleças”, isto é, os três sítios que constituem, hoje, um todo denominado Praça da República.

Em 1850, a actual Praça da República estava por empedrar, era percorrida por carroças, algumas caleças e assaltada pela vozearia dos comerciantes. A dois passos dali, no então edifício da câmara municipal (actual galeria municipal) funcionava, no rés-do-chão, o mercado de peixe e, no primeiro andar, o Tribunal e a Câmara Municipal.
O adro da igreja e o seu interior continuavam a servir de cemitério da vila.

 Foi, em meados do século XIX, que se começou a desenhar, de modo mais sólido, a fisionomia da Praça da República.
Em Abril de 1853, a Câmara Municipal de Aldegalega deliberou proceder à plantação de árvores, realizou obras e proibiu a passagem de «carros, carretas, cavalgaduras maiores ou menores ou gado de qualquer espécie pelo terreno da praça de novo aterrado e terraplanado» com o fim de dar à Praça «um aformoseamento tal que com comodidade e segurança na mesma se pudesse transitar e passear, sem se incorrer no perigo iminente de ser atropelado.» A questão do trânsito, da segurança e do “excesso” de velocidade é um problema antigo…

Por essa altura, já estava construído o imponente imóvel de António Pereira Duarte (Praça/R. Alm. Cândido dos Reis).

Na linha das obras que vinha realizando, a câmara deliberou, em 1867, vender o edifico da cadeia e construir uma nova. O edifício foi adquirido por António Máximo Ventura e, mais tarde, o seu filho, Cândido José Ventura, ali construiu um admirável chalé, que foi demolido em 1993. A cadeia situava-se na esquina da Praça da República/R. Guerra Junqueiro.

Em 1869, foi construído o primeiro coreto, todo em madeira, por iniciativa da Sociedade Filarmónica 1º de Dezembro, que se degradou e foi substituído, trinta anos depois, por outro em ferro, construído por subscrição pública e colocado “no pequeno largo fronteiriço à R. Direita, largo que faz parte da Praça Serpa Pinto.” Por essa altura, já a Sociedade Filarmónica 1º de Dezembro tinha ali a sua sede, no local que hoje se conhece.

O primitivo topónimo do lugar foi Praça Serpa Pinto, em “homenagem e agradecimento ao explorador pela maneira briosa porque sustentou a honra e o nome de Portugal nas longínquas paragens africanas.”

A Praça da República foi a jóia da Vila de Montijo. Mercado, centro cívico, local de convívio, centro nevrálgico do pequeno mundo aldeano, transformou-se, nos últimos anos, em peça de pechisbeque tão maltratada tem sido. Quem a conheceu chora, hoje, a saudade da sua harmonia. Cada fachada da Praça da República guarda uma história, que será contada mais tarde.


Ruky Luky

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Praça da República

Uma Viagem ao Passado (1)

O "pequeno rossio" do século XV apresentava este aspecto no início do século XX.

No século XV, o local que hoje se denomina de Praça da República era descrito como um “rossio pequeno em redor da Igreja do Espírito Santo”, em oposição ao maior, que se localizava na actual Praça 1º de Maio, outrora o centro da vila e dominado pela Santa Casa da Misericórdia.
Naquele século, crescendo a vila em direcção ao rio, o povo aldeano solicitou ao Mestre da Ordem de Santiago, D. Jorge, filho de D. João II, que fosse construída uma nova igreja mais no meio da povoação. O pedido foi indeferido, mas o povo aldeano, numa lição que os montijenses devem reter, não baixou os braços. Permitiu que a câmara municipal lançasse um imposto destinado à construção da nova igreja e, como descreve o Pe. António Carvalho da Costa «o braço do povo (a) fez e ornou de prata e ornamentos». Em 1498, estava pois construída a Igreja do Espírito Santo, no “rossio pequeno”.
Como é consabido as igrejas eram também utilizadas como cemitério e, assim, dentro da Igreja do Espírito Santo e no seu adro foram enterrados milhares de corpos ao longo de mais de três séculos. A Praça da República foi o principal cemitério de Aldeia Galega, até ao século XIX. Na década de 50 e 60, do século XX, quando a Praça foi sujeita a obras de remodelação, foram desenterradas muitas ossadas do primitivo cemitério. Ainda hoje, quem passear junto à igreja facilmente verificará a existência de lajes tumulares.
À medida que a população se foi deslocando para o centro da vila e se construiu o “porto novo”, o “pequeno rossio” transformou-se, paulatinamente, no centro de Aldeia Galega do Ribatejo.
Desde muito cedo, ali se ergueram palanques para as corridas de touro, que era reprovado pelo visitador da Ordem de Santiago, que considerava muito indecente que os homens se sentassem perto das mulheres. Contudo, apesar da pesada ameaça de excomunhão, as touradas continuaram a realizar-se no adro da igreja.
No século XIX, o pequeno rossio, além da Igreja do Divino Espírito Santo, era ladeado, a poente, pela cadeia e um conjunto de casas nobres e, a sul, pela Estalagem das Caleças (antiga Fábrica TÓBOM). O conjunto edificado da cadeia e das casas nobres, que corresponde hoje ao espaço ocupado pelo Banco Santander Totta até ao antigo Centro de Convívio de Reformados (Av.ª dos Pescadores), denominava-se Bairro da Cadeia. Entre o Bairro da Cadeia e o actual Mercado Municipal, encontrava-se o açougue e a eira pública.
A Praça era o local privilegiado para a realização de festas, de cunho sagrado ou profano, como as festas do Divino Espírito Santo e de outras confrarias, e para a realização de mercados.
Em 1839, estabeleceu-se o mercado das hortaliças e, prosperando também o mercado suinícola, a Câmara Municipal de Aldegalega deliberou proibir que “os porcos fossem expostos ou demorados nos sítios da Praça, Cadeia e Caleças”, isto é, os três sítios que constituem, hoje, um todo denominado Praça da República.
Em 1850, a actual Praça da República estava por empedrar, era percorrida por carroças, algumas caleças e assaltada pela vozearia dos comerciantes. A dois passos dali, no então edifício da câmara municipal (actual Galeria Municipal) funcionava, no rés-do-chão, o mercado de peixe e, no primeiro andar, o Tribunal e a Câmara Municipal.
O adro da igreja e o seu interior continuavam a ser o cemitério da vila.

Ruky Luky






segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Um Passeio por Montijo

Descendo a Rua da Graça


Esquadra da Polícia de Segurança Pública. Nada na sua fachada nos diz que poderemos estar face a um dos edifícios mais antigos de Montijo.

Deixemos a Igreja de S. Sebastião, primeira Matriz de Montijo, e a Casa da Roda e vamos Rua da Graça fora.
Montijo, Novembro de 2013.
O edifício está bem identificado e todos o conhecem, pois trata-se da Esquadra da Polícia de Segurança Pública. Nada na sua fachada nos diz que poderemos estar face a um dos edifícios mais antigos de Montijo. Contudo, um olhar mais perspicaz levar-nos-á a descobrir os dois pináculos, coroamento dos contrafortes, que eram muito usados na arquitectura gótica. Em 1842, já estavam extintas as ordens religiosas, o edifício passou a integrar o património municipal. Depois de sucessivas campanhas de obras, ficou apto a receber um aquartelamento militar e, posteriormente, as instalações do telégrafo, a escola primária e a actual esquadra da polícia. Inicialmente fora o convento e o hospício dos Frades da Graça, dai o nome por que ficou conhecida aquela zona da actual cidade de Montijo.
À excepção dos pináculos, nada resta que possa identificar os traços arquitectónicos da primitiva construção, que era vedada por uma cerca e tinha capela própria, que foi desmanchada em 1842, assim como a cerca da propriedade, cujos terrenos se estendiam até ao rio. Do destino dado á capela nada se sabe, quanto à cerca, parte dela foi utilizada para construir o muro do cemitério.
Por mera curiosidade, assinale-se que, no outro extremo da vila de Aldegalega (R. de Santo António/Avenida dos Pescadores) erguia-se o Convento de Nª Srª da Conceição, no quarteirão situado entre a Avª Luís de Camões e a Praça Brasília, que chegou a albergar uma Casa para Educação de Meninas Pobres e um recolhimento para idosos. A acabou consumido pelas chamas. A Travessa da Cerca (Av.ª Luís de Camões) recorda a cerca do convento.
O passeio deve continuar nem que seja só meia dúzia de passos.


À excepção dos pináculos, nada resta que possa identificar os traços arquitectónicos da primitiva construção
Aldegalega do Ribatejo, 1862.
Os aldeanos eram conhecidos pela sua têmpera, gente que fazia e que não estava à espera que uma mão protectora resolvesse os seus problemas.
Naquele ano, por altura das Festas da Piedade, os principais habitantes de Aldegalega resolveram mandar construir uma praça de touros, nos terrenos anexos ao Convento da Graça. Vinte anos após a sua construção aquela praça foi demolida e, no mesmo local, edificada outra com capacidade para três mil espectadores e um diâmetro exterior de quarenta e dois metros, respeitando o projecto do Mestre de Carpintaria, José Vito da Silva. A Praça de Touros de Aldegalega foi inaugurada em 29 de Junho de 1888. No final da primeira metade do século XX, devido aos sinais evidentes de degradação que ostentava, a praça foi encerrada e, no seu local, foi construído o Cinema Teatro Joaquim de Almeida.



Rua da Graça. O convento, que albergou as tropas napoleónicas comandadas pelo General Loison, "O Maneta", e, contígua, a Praça de Touros.
Ainda hoje há quem ao olhar para o edifício do cinema se lembre das tardes de glória protagonizadas na praça de touros, que ali existiu, e outros velhos montijenses recordam aquela tarde em que um touro desembolado entrou nas instalações municipais – a abegoaria –, contíguas à praça, e trespassou as mulas que ali estavam. A Travessa da Praça de Touros lembra a existência daquela praça nas imediações.
Mas isso passou-se no tempo em que os touros vinham a pé e as carroças municipais eram puxadas por mulas.


Ruky Luky