Factos e Tradições
Aparição da Imagem – Segundo Frei Agostinho de Santa
Maria, a imagem apareceu junto duma aroeira existente perto de uma pequena
nascente de água. A imagem foi então conduzida para uma pobre moradia, no cume
do outeiro, e colocada numa cantareira, e ali lhe prestaram culto.
Ecoando a notícia da aparição concorreu imenso povo
que, com as suas ofertas, construiu uma pequena ermida. A imagem foi então posta
no altar novo, mas, para surpresa de todos, no dia seguinte, foram encontrá-la
na cantareira. Como se o facto se repetisse, os devotos mandaram fazer uma
imagem mais pequena, que foi colocada no novo altar, permanecendo a antiga na
cantareira.
Diz o Pe. Manuel Frederico Ribeiro da Costa que não se
podendo «averiguar a verdadeira origem da aparição da imagem, todavia não nos
resta a dúvida de que ele é duma grande antiguidade. O mesmo autor, no entanto,
aventa a hipótese do aparecimento da imagem se ter verificado no século XIII.
A imagem é invocada com o título de Nossa senhora da
Atalaia, por se ter erigido a ermida no monte da Atalaia. Também chegou a ser
invocada com o título de Nossa senhora dos Pinheiros, referência ao facto de,
em tempos passados, existir grande quantidade de pinheiros, naquele local. Nos
registos mais antigos, a imagem aparece estampada entre pinheiros.
Nossa
Senhora da Atalaia é designada também por Nossa Senhora das Alfândegas ou pelo
título de Soberana Protectora das Alfândegas.
Atalaia, 1906 |
Atalaia – O núcleo histórico e o santuário da Atalaia localizam-se num outeiro, a cerca de 5 Km a oeste da sede do
município. A povoação ganhou o estatuto de freguesia, em 4 de Outubro de 1985,
tem uma população de 1309 habitantes, e uma área de 2,58 km2. Passará a
integrar a União das Freguesias de Atalaia e Alto Estanqueiro-Jardia.
Devido
à construção da ponte Vasco da Gama, transformou-se numa área de expansão
urbanística.
Ainda
hoje, de Atalaia se goza de um amplo e vastíssimo panorama, que, na década de
trinta, era assim descrito: «Avistam-se as serras da Arrábida, de Montejunto e
Sintra, a formosa cidade de Lisboa, as aprazíveis vilas de Almada, Alhandra,
Palmela, Vila Franca, Seixal, etc., as férteis campinas do Ribatejo, as
importantes salinas de Alcochete e uma infinidade de aldeias e casais
espalhados pelas encostas e pelas planícies, por entre verdes pinheirais,
campos amanhados e pomares floridos.» O panorama nocturno, que dali se avista,
é também deslumbrante.
Entrada de um círio |
Círio – O Santuário de Nossa Senhora da
Atalaia foi o mais importante e concorrido da Estremadura e do Alentejo. Para
disciplinar o concurso ao santuário foi determinada uma data para cada
paróquia, embora a mais importante romaria, que congregava o maior número de
círios, se realizasse, no final de Agosto, como ainda hoje acontece, e por isso
se passou a denominar também de “Festa Grande”.
Consta que cada romaria transportava e colocava uma
grossa vela (círio) junto ao altar e, desse facto resultou o nome dado às
romarias organizadas que concorriam ao santuário. Actualmente, os círios deram
lugar às bandeiras.
Aceita-se, hoje, que a expansão do Santuário terá
acontecido devido à romaria dos oficiais da Alfândega, em 1507.
Ignora-se a data da primitiva romaria. O que se sabe é que é peregrinação antiga que se perde
na poeira dos tempos. Segundo o semanário,
«O Domingo», «a ermida é antiquíssima, porque em 1211 ali descansava das lides
guerreiras o destemido e valente soldado lusitano António de Villa Verde
Froes.».
Por
outro lado, a “Confraria de Nossa Senhora da Atalaia erecta na Aldeia da Quinta
do Anjo”, afirmava, em meados do século XIX, que «pela diuturnidade dos
séculos» adoptou o «louvável e religioso costume de ir festejar a Mãe de Deus
no referido Sítio da Atalaia, em todos os anos, no último domingo de Agosto»,
e, na mesma data e no mesmo sentido, se pronunciaram os “Festeiros de Nossa
Senhora da Atalaia de Ribatejo do Círio pertencente ao termo de Sesimbra», que
declararam que «desde tempo imemorial (vão) todos anos fazer a sua festa no
último domingo de Agosto.»
É
extensa a relação dos círios que ao
longo dos tempos concorreram ao santuário.
Real Círio dos Pescadores de Aldegalega – Referido já no séc. XVI. Festejava no último
domingo de Abril. Extinto. Círio dos
Marítimos Casados e Solteiros de Alcochete – Já festejava em 1530, na
segunda-feira de Páscoa, tradição que ainda hoje se mantém. Círio Donzelas da Vila de Alcochete –
Concorreu em 1856. Círio dos Pescadores
de Setúbal – Festejava na segunda-feira de Páscoa. Ignora-se a data da
fundação. Foi extinto em 1820. Círio da
Palma (Alentejo) – Extinto. Círio de
Oeiras – Já festejava em 1507, em domingo da Santíssima Trindade. Foi um
dos círios mais ricos que concorreu ao santuário. Extinto. Círio da Alfândega de Lisboa – Constituído em 1507 pelos oficiais
da Alfândega de Lisboa e pelo povo de Lisboa, que atribuíram à peregrinação que
tinham realizado ao Santuário da Atalaia o milagre da extinção da peste que
tinha assolado Lisboa. Naquela data foi instituída a Confraria de Nossa Senhora
de Atalaia, que se passou a organizar anualmente a peregrinação ao santuário.
Em 1745, a confraria estava dissolvida, mas a romaria continuou, porém, à custa
da fazenda real. O Círio foi extinto em 1833. O Círio festejava no domingo da
Santíssima Trindade.
A caminho da Atalaia |
Nossa
Senhora da Atalaia é designada também por Nossa Senhora das Alfândegas ou pelo
título de Soberana Protectora das Alfândegas. Círio de Coina - Já existia em 1799 e festejava no segundo domingo
de Julho. Extinto. Círio de Sarilhos
Pequenos – Em 1790 já festejava, no último domingo de Julho. Extinto. Círio dos Trabalhadores de Alcochete.
Festejava no primeiro domingo de Agosto. Extinto. Círio de Cabrela. Concorria no segundo domingo de Agosto. Extinto. Círio de Alhos Vedros – Concorria, em
1781, no segundo domingo de Agosto. Extinto. Círio de Vila Fresca de Azeitão - Concorria à Festa Grande.
Extinto. Círio dos Marítimos de Setúbal
– Concorria à Festa Grande. Extinto. Círio
de Sesimbra. Círio do Seixal – Concorria à Festa Grande. Extinto. Círio Novo de Setúbal – Concorria à
Festa Grande. Ignora-se a data da fundação. Dissolveu-se em 1778 e restaurado
em 1894. Extinto. Círio de Azóia. Círio de Sacavém – Extinto em 1839. Círio de Arrentela – Extinto. Círio do Barreiro – Um dos primeiros
círios a concorrer aio santuário. Extinto. Círio
da Quinta do Anjo – Ignora-se a data da fundação. Já é nomeado em 1780.
Ainda concorre à Festa Grande. Círio de
Palmela – Extinto. Círio do Lavradio
– Extinto. Círio dos Pretos Crioulos de
Lisboa – Extinto. Círio dos Pretos
do Bairro Alto de Lisboa – Instituído em 1743 e extinto em 1843. A Rua da
Atalaia, naquele bairro, lembra a existência daquele círio. Círio dos Pretos do Bairro de Alfama de
Lisboa – Extinto. Círio dos Montes
de Canha - Extinto em 1855. Círio da
Vila de Canha – Extinto. Círio de
Aldegalega – Instituído por altura do terramoto de 1 de Novembro de 1755,
apelidou-se primitivamente de Círio do Terramoto. Posteriormente, passou a
denominar-se de Aldegalega e festejou com o nome de Festa da Terra até à
primeira metade do séc. XX. Círio de
Aldegalega (Colera-morbus) – Fundado em 1833. Extinto. Círio de Sarilhos Grandes – Extinto. Círio da Moita – Extinto. Círio
da Freguesia dos Anjos (Lisboa) – Fundado em 1855 – Extinto. Festejava no
terceiro domingo de Agosto. Círio de
Samora Correia – Fundado em 1823. Festejava na Festa Grande. Círio de Chelas – Ignora-se a data da
fundação. Extinto em 1879. Celebrava na Festa Grande. Círio da Freguesia de S. Sebastião da Pedreira (Lisboa) – Fundado
em 1844. Extinto. Festejava na Festa Grande. Círio da Freguesia do Beato António (Lisboa) – Fundado em 1823.
Extinto em 1879. Festejava na Festa Grande.
Entrada de um círio |
Círio da Freguesia de S. Lourenço (Lisboa) – Fundado em 1833.
Extinto. Festejava na Festa Grande. Círio
da Freguesia de Santa Isabel (Lisboa) – Fundado em 1857, por ocasião dum
surto de febre-amarela. Extinto. Festejava na quinta-feira seguinte à Festa
Grande. Círio da Freguesia de Nossa
Senhora da Ajuda (Belém – Lisboa) - Fundado em 1857, por ocasião dum surto
de febre-amarela. Extinto. Festejava na segunda-feira seguinte à Festa Grande. Círio dos Olhos de Água (Palmela) –
Fundado em 1833. Celebra na Festa Grande. Círio
da Carregueira (Palmela) – Fundado em 1833. Celebra na Festa Grande. Círio de Santo Estevão de Alfama –
Fundado em 1850. Extinto em 1879. Festejava no primeiro domingo de Setembro. Círio do Mosteiro do SSmo. Salvador
(Lisboa) – Fundado em 1839. Extinto. Festejava no segundo domingo de Setembro.
Substituiu o Círio dos Pretos de Alfama. Círio
do Convento das Mónicas (Lisboa) – Fundado em 1866. Extinto em 1874.
Festejava no terceiro domingo de Setembro. Círio
de Arroios (Lisboa) – Fundado em 1879. Extinto. Celebrava na Festa Grande. Círio de Santa Engrácia (Lisboa) –
Fundado em 1872. Extinto em 1877. Celebrava na segunda-feira seguinte à Festa
Grande. Círio de Santos-o- Velho –
Fundado em 1873. Extinto. Na dévcad de trin do século XX ainda celebrava na
segunda-feira seguinte à Festa Grande. Círio
de Nossa Senhora da Anunciada (Setúbal) – Fundado em1874. Extinto em 1879.
Celebrava na segunda-feira seguinte à Festa Grande. Em 1935, ano em que foi criado o Círio de Montijo, já extinto,
concorreram os círios de Sesimbra, da Quinta do Anjo, de Olhos de Água e
Carregueira, além dos círios das Francesinhas.
Em 1945, foi fundado o Círio Novo da Atalaia, que, em 1950
adquiriu a sua sede, que custou cem contos.
O
Círio dos Atrasados foi o último fundado em Montijo, em 1940.
Círio dos Atrasados, 1949. Círio civil. |
Círio dos Atrasados (Montijo) – Foi fundado em 31 de Agosto de 1940.
Heterogéneo na sua composição social, a justificação do seu nome reside no
facto de se deslocar para a Atalaia, quando todos os outros círios já se tinham
retirado, isto é, no último dia dos festejos, segunda-feira.
A
partida efetuava-se cerca das 15H00 e, na Atalaia, era cumprindo um programa
que incluía jantar, baile, divertimentos populares, lavagem e pequeno-almoço,
almoço ajantarado e partida para o Montijo. Não havia celebrações religiosas.
Era um círio civil. Foi presidente honorário do Círio, António Joaquim Marques.
O
Círio foi extinto na década de sessenta.
As velas (círios) foram substituídas pelas bandeiras. |
Extinção dos Círios – Várias foram as causas que concorreram, ao longo dos séculos, para a interrupção e a extinção dos círios. O autor de
“Os Romeiros de Nossa Senhora da Atalaia (1903) ” afirma que «Em todos (os
círios) mais ou menos se tem dado algumas interrupções, já devido ao cepticismo
do século, já às excessivas despesas, que os mesmos romeiros têm na solicitação
de provisões, licenças, termos de responsabilidade, depósitos pecuniários,
festas e lausperenes nas igrejas, onde se acham as imagens de Nossa Senhora dos
seus círios.»
A
proibição da realização de romarias, por razões de saúde pública, em tempo de
epidemias; as Invasões Franceses – os exércitos franceses saquearam a ermida -
e os novos ideais emergidos da Revolução Francesa, a crescente laicização da
sociedade, que se opera a partir do século XIX, o incremento dos ideais
republicanos e anticlericalismo a eles aliado serão outras causas a somar às
apresentadas pelo autor do opúsculo acima citado. Actualmente, factores
demográficos e sociais colocam em risco e existência futura dos círios. As
direções não se renovam, porque os jovens se afastaram do associativismo.
No
final do século XIX, foram instituídos os círios
civis, cuja Federação tinha por fim organizar anualmente «um grandioso
arraial a fim de levar à prática mais profusa e brilhante a propaganda
anticlerical.»
Segundo
as opiniões mais conservadores, os círios civis constituíam «uma caravana de
frasqueiros que com profusão e brilhantismo prestavam um cívico culto de
festejo ao – mune-ventre, e aonde exímios palradores exibem com tom e som
bombásticos discursos de doutrina estragada e anti-religiosa, contra todos os
princípios absolutos e humanitários. Aberrações de espírito toleradas entre
nós, atenta a brandura nos nossos costumes e a licença dos belos tempos em que
vivemos! Estes frascários, genuína reprodução dos antigos epicuristas, somente
veneram e adoram o deus -papaizana -, e abominam estranhamente a moral e a
religião do Evangelho cristão.»
A
implantação da República, em 5 de Outubro de 1910, teve forte repercussão sobre
os movimentos religiosos, nomeadamente, sobre a romaria e os círios da Atalaia.
Em
Aldegalega do Ribatejo o Partido Republicano elegeu os seus candidatos à Câmara
e ao Senado Municipal, em 1908, sem que este facto tivesse perturbado as celebrações.
Em 1910, por exemplo, a arrematação do terrado foi presidida por Manuel
Ferreira Giraldes, primeiro presidente da Câmara Municipal de Aldegalega eleito
pelo PRP, acompanhado pelos vereadores Álvaro Tavares Mora, José Cipriano
Salgado Júnior e José Fernandes da Costa Moura.
Em 1911, na primeira Festa Grande após a implantação da
República, a romaria perdera o brilhantismo dos anos anteriores, porque, devido
à insegurança que reinava, quase todas as famílias que ali costumavam ir,
receosas de cenas de sangue, que ali se esperavam, deixaram-se ficar em casa.
Manuel Ferreira Giraldes, presidente republicano da câmara,
eleito em 1908, presidiu à arrematação do terrado. Os conflitos
surgiram depois da implantação da República.
|
O clima de insegurança adensara-se porque o Administrador do Concelho,
contrariando as vozes republicanas, afiançara que , mesmo à força, a procissão
seria realizada. Mas, segundo testemunho da época, «Os abutres de batina,
estribados na vontade da autoridade, ainda conseguiram pôr de fora da igreja o
pendão que voltou para dentro em pedaços com a velocidade de um raio.
Em seguida apareceu no púlpito uma daquelas aves que começou a dizer mal
da Lei da Separação da igreja e do seu autor a que o povo respondeu de chapéu
na cabeça com vivas ao sr. Dr. Afonso Costa e abaixo o clero, correndo sobre
eles para uma liquidação de contas. Valeu-lhes nessa ocasião, a força que ali
estava encarregada do policiamento.»
Em 1912, na esteira dos círios civis, a Romaria a Nossa Senhora da
Atalaia passou a denominar-se Festas Cívicas da Atalaia, e foram organizadas
pela Junta Local de Livre Pensamento, que convidou diversas
colectividades «a fazerem-se incorporar
nas festas da Atalaia, que este ano deixarão de ser a bambochata dos mais
anos», noticiava o jornal local.
Testemunhou voz republicana: «Iniciaram-se ontem as festas cívicas no pitoresco lugar da Atalaia. Há muitos anos que a Atalaia não era tão concorrida como esta
sendo agora com as festas cívicas. É que o povo discorda por completo
com tudo que lhe cheire a cera, aborrece os santos
de pau e odeia os padres.
Bem
haja a Junta Local do Livre Pensamento única organizadora de tão grandiosas festas e que tão incansável se mostra preparando todos os atractivos próprios dum bom arraial, de molde que nada ali falte de bom e bonito aos numerosos forasteiros que hora
a hora estão chegando.
A
feira de gado e o
arraial oferecem um aspecto soberbo atendendo ao grande número de barracas de negócio, escolas de tiros, circos de cavalinhos, teatros, animatógrafos, etc.
0 cortejo cívico organiza-sehoje, devendo sair ás 15 horas da sede da Junta para o local do comício, incorporando-se nele representantes
de várias agremiações laicas, bandas
de musica e bandeiras de diversas colectividades.
Às
12 horas será queimado um bonito fogo de
artificio. Entre outras abrilhantarão estas festas
a distinta banda Marcial Democratica e a Fanfarra Marítima
de Porto Brandão.»
Pelo
mesmo diapasão afinaram os republicanos a sua voz, nos anos seguintes.
Em 1914,
«foi grandioso Foi grandioso o
esplendor que este ano revestiu a chamada Festa Grande .
Ninguém supunha tão grande número de barracas e tão extraordinária ocorrência
de forasteiros.
As
festas cívicas da Atalaia, este ano,
pela sua enorme concorrência de povo, fizeram-nos lembrar as que ali se faziam há quinze ou vinte anos. É que o povo de toda a
aprte começa a copmpreender que os
santos não são não são precisos nas
festas ao mesmo tempo quie outros
tartactivos vê ele que além de distraitrem não custam dinheiro nem muitas vezes
o sacrifício de andarem com o chapéu na mão sob um sol abrasador ou um
aguaceiro que inesperadamente se despegou lá das alturas. Não se viu ali – nem
nunca mais se tornara a ver – criaturas rojando-se pelo chão desde o cruzeiro
até à capela, promessa tola que merecia sempre censura e que muitas vezes
provocava conflitos graves.
A distinta comissão soube muito bem preparar a festa para todos os paladares, entendendo-se com o capelão e dizer-lhe que dentro da igreja era ele quem mandava.E assim evitou que algum tolo ou tola ficasse descontente com a festa por não poder deixar na caixa das almas a gorjeta, para o padre comer à ceia um leitão assado...
Programa das Festas Cívicas da Atalaia |
Abrilhantou
as festas tocando num bonito coreto a
distinta Banda Democrática de Aldegalega, que do público mereceu fartos e
entusiásticos aplausos.»
A
Revolução de 26 de Maio de 1926 permitiu, de novo, as manifestações religiosas
públicas e a afirmação do carácter religioso da romaria.Porém, a grande
concorrência de círios verificada em épocas anteriores desvasnescera-se.
A
Revolução de 25 de Abril de 1974 em nada alterou o espírito da festa e romaria
da Atalaia.
Actualmente,
só seis círios concorrem ao Santuário da Atalaia. No último fim-de-semana de Agosto (Festa Grande), os Círios da
Quinta do Anjo, o primeiro a chegar, na sexta-feira; o Círio da Azóia, que se
apresenta no sábado; o Círio Novo, o Círio dos Olhos de Água e o Círio da
Carregueira que festejam no domingo. Na Páscoa,
o Círio dos Marítimos de Alcochete. Nenhum é de Montijo.
Festa Grande – Confundem-se,
actualmente, a Festa Grande, a Feira e o Arraial da Atalaia, embora tenham
sido, na sua origem, conceitos realidades diferentes.
De Festa Grande era
denominada a romaria que agrupava maior número de círios e que se realizava no
último fim-de-semana de Agosto.
O arraial correspondia
ao lado profano da festa e era montado no adro da igreja com barracas diversas
e manifestações de convívio e de recreio que foram variando várias consoante as
épocas.
A Feira passou a
realizar-se a partir de 1751.
Segundo Alvará
registado na Câmara Municipal de Aldeia Galega, em 24 de Agosto de 1751, D.
José, Rei de Portugal concedeu ao capelão da Atalaia, Pe. António Pacheco
Pimentel, autorização para realizar uma feira no último sábado, domingo e
segunda-feira de Agosto, e aplicar o produto do terrado para obras da Igreja. O
terrado era administrado pelo Juiz de Fora e Oficiais da Câmara Municipal.
O terrado era
arrematado pelo maior lanço oferecido e o arrematante e este tinha em seu
benefício rendimento das taxas pagas pelo aluguer de terrenos municipais
ocupados pelos diversos estabelecimentos e divertimentos, por ocasião da feira.
Bem se pode afirmar,
volvidos os séculos que a feira resistiu às armadilhas do tempo, ganhando
sempre novas qualidades e formas de organização.
Segundo a tradição oral foi naquele local que apareceu
a imagem de Nossa Senhora.
Quinta-feira
da Ascensão ou Quinta-feira da Espiga – Sem a animação
e o concurso de outras épocas, o Dia da Espiga é ainda celebrado na Atalaia, ao
fim da tarde de quinta-feira.
A Festa da Ascensão é
celebrada no quadragésimo dia após o domingo de Páscoa, sempre uma
quinta-feira, e é uma das principais festas do ano cristão.
No princípio do século
XX, Montijo despovoava-se porque, à tarde, a população corria para a Atalaia e
para os campos para festejar o Dia da Espiga.
Milagres – Há, no Santuário da
Atalaia, uma dependência que alberga um conjunto de ex-votos, que testemunham
as graças recebidas por intervenção da imagem da Senhora da Atalaia.
A fé popular e a
tradição oral atribuem inúmeros milagres à intervenção de Nossa Senhora da
Atalaia, alguns descritos nos ex-votos.
Porém, dois acompanham
a história dais intervenções da imagem.
Filipe II de Castela,
I de Portugal, mandou cortar alguns pinheiros que existiam em Atalaia para a
construção de navios. Os pinheiros foram marcados e, na data aprazada, quando
se ia proceder ao seu corte, foram encontrados todos tortos e incapazes de
serventia para o fim a que se destinavam,
Outro dos milagres
guardados pela tradição conta que uma velha octogenária tinha uma filha e que a
filha falecera após laborioso parto, parindo, ainda assim, um menino vivo. Não
podendo a velha mulher dar de mamar à criança «rogou com tanta fé a Nossa
Senhora da Atalaia, que atenta à sua miséria, lhe fizesse o milagre de ela ter
leite com que amamentasse o seu netinho, e em tão boa hora foi feita sua
humilde súplica, que a Virgem Mãe de Deus e de misericórdia acedeu aos seus
desejos e a pobre velha alcançou o que ambicionara.»
Profano – O lado profano da romaria estampou-se, ao longo dos
séculos, no arraial, que,
modernizando-se o que deve ser modernizado e atendendo-se aos costumes de cada
época, continua bem retratado pela pena do Pe.
Manuel Frederico Ribeiro da Costa, que, em 1887, anotou:
«O que propriamente se designa «arraial de Nossa Senhora de Atalaia» é a área compreendida entre os três cruzeiros, no monte de Atalaia, onde assenta
a capella, como já
indicámos no capitulo. Neste arraial
é celebre o movimento popular por occasião das festas do último domingo de Agosto. As casas, à
excepção de mui poucas, em que vivem alguns pobres carvoeiros, conservam-se fechadas um ano inteiro, para serem ocupadas nos
dias das festas deste domingo, e nos outros em que porventura há alguns círios a festejar.
Concorrem
a estas festas do última domingo de Agosto, de grandes distâncias os diversos cirios e muitas pessoas, em romaria, que já anteriormente mencionamos. Carros,
caleças, jumentos, cavalos, etc.
vindo de várias longitudes, cobrem de dia e noite as estradas, apinhoadas de gente, mobilias, utensilios, quinquilharias, e todo o preciso para um arraial e uma
feira. As semanas anteriores a estas
festas são empregadas em preparativos;
homens e mulheres, todos, como que à porfia, concorrem nesta occasião ao santuário da Virgem de Atalaia.
O maior concurso de gente é no sábado
do último domingo de Agosto, que sem
exageração, em alguns anos, tem excedido o número de oito ou dez mil
pessoas.
Com
segurança pode-se afirmar que é este arraial o mais concorrido em todo o distrito de Lisboa. A par
das distrações, que por
esta ocasião há no arraial, sobressai a grande feira anual de gado de todas as espécies, por detrás da
capela, num vasto
âmbito, feira que dura três dias. Também há grande número de casas de pasto, botequins, já em casas
proprias, já em
barracas e vários divertimentos, como companhias dramáticas e equestres. Por todos os lados da Capela
não se divisa senão musicas, gaitas de foles
e variados entretenimentos.
Parece que neste arraial
somente respira o folguedo.»
Arraial, figura datada de 1864. |
Muitos anos mais tarde, na
década de quarenta do século XX, Álvaro
Valente registou que havia famílias que arrendavam casa em Atalaia «e, logo
que rebentava a festarola, mudava-se para lá com armas e bagagens». E, mais
adiante, a sua escrita vibrante dá-nos esta descrição da partida para Atalaia:
« O corropio era constante. Manatas (proprietários, fazendeiros), latambas
(trabalhadores rurais) e mangalhonas (mulheres de baixa classe), tudo marchava
para a romaria. Carros que partiam cheios, carros que chegavam e esperavam
fregueses, uns para baixo outros para cima, um verdadeiro inferno E isto
prolongava-se pela noite dentro até de madrugada! (…).
Na Atalaia a efervescência
começava semanas antes da romaria. Quando se aproxima a «Festa Grande», como
há muitas visitas e gente estranha, todos se afreimam em limpezas radicais para
dar a impressão duma primorosa estância de repouso, alegre, fresca e saudável.
Arejam-se e preparam-se também
os palheiros e as cocheiras e cavalariças; ornamentam-se as «salas» dos bailes
para a rapioca permanente das duas noites; e não há uma só casa onde se não
aprestem todos os aposentos para os alugar ou receber amigos e família.
Nos dias mais próximos da romaria
chegavam as barracas da feira, os «cavalinhos», os circos, os teatros de
fantoches, as barracas de «comes-e-bebes», as escolas de tiro ao alvo, e um
totelimúndi de aldrabões com quinquilharias, roletas ambulantes com os manhosos
das batotas, vendedores de bugigangas, de calçado, de mantas, objectos de oiro
e pechisbeque, que era uma verdadeira epidemia!
Na véspera do primeiro dia
estava, finalmente, tudo a postos.
E conforme vinham chegando no
sábado os vapores e os círios, assim a Atalaia se ia animando cada vez mais.
Álvaro Valente deixou-nos
ainda este pormenor referente a Atalaia: «É um local lavado de ares,
frequentemente batido dos vendavais, e a que nos últimos anos se resolveu
chamar – não sei porque motivo – a «Sintra de Montijo»!»
O Progama das Festas de 2013
repetiu a praxis dos anos anteriores: chegada dos círios em procissão;
actividades religiosas; bailes e convívios nas sedes dos círios, arraial e
espectáculos de variedades e a lavagem na Fonte da Senhora.
Hoje como ontem, o profano e o maravilhoso
cristão unem-se por quatro dias em louvor aos corpos e às almas que edificam a
religiosidade popular na sua mais pura essência.
Renovar-se-ão geracionalmente
os círios? Será fundamental que os jovens assumam a direcção das associações
sob pena de se quebrar um elo secular de religiosidade popular.
Santuário de Nossa Senhora da Atalaia – Ignora-se a data da construção da igreja, embora haja
testemunhos que a dão por construída no século XV. O santuário abre-se para um
espaçoso adro marcado, a poente, por um cruzeiro de gosto manuelino edificado em 1551. Outros dois cruzeiros estão
localizados a norte da Igreja, na estrada que conduz a Alcochete, e a sul
localiza-se o denominado Cruzeiro de Alcochete, construído em 1669, e o
Cruzeiro da Estrada ou das Esmolas, junto à antiga Estrada Real, cuja data se
ignora.
Seguindo a Narrativa Histórica do Pe. Manuel Frederico
Ribeiro da Costa, os cruzeiros são assim apresentados: «O (cruzeiro) fronteiro
à capela, na distância de 220 mts, é formado de pedra lioz, no estilo
gótico-bizantino, vendo-se do lado do nascente, no capitel, um baixo-relevo,
representando a imagem de Jesus Cristo, e no do poente a de Nossa Senhora da
Piedade.
Sobrepõe este cruzeiro uma cúpula, sustida por quatro
colunas ligadas com varões de ferro. Na base da cruz se lê a inscrição: «Este
cruzeiro mandou fazer a confraria de Lisboa, era 1551».
O segundo é também de pedra lioz encimada em dois
degraus, tem na face do norte gravado o seguinte rótulo: «Esta cruz mandou
fazer Domingos Ferreira Patarata e sua mulher por sua devoção, pede um
Padre-nosso e Ave-Maria pelas almas; feita no anno de 1669, de Alcochete».
O terceiro é de cantaria tosca e ordinária; sotoposto
a um pedestal de alvenaria com quatro faces e junto ao pé da cruz está um mealheiro
de ferro para receber as esmolas que transitam pela estrada do Alentejo.»
O poeta José Joaquim Caria sentiu assim a Atalaia:
Esta branca povoação
Que p’lo monte se espraia,
Nasceu sob a protecção
Da Senhora da Atalaia.
O Santuário que vês,
Emoldurado em verdura,
Foi uma Santa que o fez
Num milagre de ternura.
Do alto da escadaria,
Entre o adro e o cruzeiro,
Com um pouco de fantasia
Podes ver o mundo inteiro.
Ruky Luky
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