sexta-feira, 23 de novembro de 2012

A Velha Cadeia de Montijo

Fontes Pereira de Melo em Montijo

O tribunal e a cadeia de Aldegalega do Ribatejo. Segundo notícia da época, era ususal «a aglomeração de caramelos às portas e janelas da cadeia.» Montijo ainda se lembra de ver os presos atrás das grades e de lhes fazer pequenos recados, nomeadamente, comprar cigarros. Foto 1906
No século XVI, já Aldeia Galega do Ribatejo [primitivo nome da actual cidade e concelho de Montijo] tinha juiz ordinário.

No século XVII, recebeu a Ouvidoria, que tinha sido transferida para Alhos Vedros, e, apesar das reformas judiciais realizadas a partir de 1832, a vila manteve sempre a sua comarca, salvo pelo curto espaço de tempo em que, por razões políticas, foi transferida para a Moita.

A primeira notícia da existência de uma cadeia em Aldegalega do Ribatejo encontramo-la numa Visitação dos Freires da Ordem de Santiago que, em 1609, «visitando nesta villa as cousas pertencentes ha comenda della, achamos a cadeia della sendo villa onde haa juiz de fora não aver cadeia mais que uma casa sem repartimento para prizão de molheres e estar sem ferros somente com umas grades de pau e pouco segura.»

Segundo o Dr. Avelino Rocha Barbosa, esta cadeia situar-se-ia na Rua Direita [R. de Almirante Cândido dos Reis], no edifício onde, hoje, se encontra um estabelecimento de restauração e bebidas. É informação que não conseguimos confirmar.

Atendendo ao estado da cadeia e à insegurança que oferecia, foi deslocalizada, em data que se ignora, para uma propriedade de Miguel Varela de Mascarenhas, que ocupava uma área compreendida entre a actual R. de Guerra Junqueiro e a Praça da República, onde Cândido Ventura construiu o seu chalet.

Pelas razões que fundamentaram a mudança das anteriores instalações, degradação do edifício e falta de condições de segurança, a partir de 1844, o Governador Civil de Lisboa passou a exigir também à Câmara Municipal «as obras e reparos que forem mais necessários para a segurança da cadeia», uma vez que os telhados ameaçavam ruir e os soalhos e os vigamentos encontravam-se bastante danificados.

Face às insistências do Governador Civil, a edilidade, em 1851, informou-o de que «o seu ruinoso estado exige de necessidades um concerto radical (e que) a obra foi orçada pelos peritos em 1.000$00 (…). A Câmara se não achava habilitada com os meios precisos para proceder aquela obra, cuja importância é muito superior às forças dos Rendimento Municipais, dos quaes subtraindo-se o indispensável para pagar os empregados pouco resta para acudir a outras obras de mais necessidade no Concelho».

Para solucionar o problema, em 1857, a câmara municipal acabou por instalar a cadeia, provisoriamente, no pátio do Quartel Militar [actual posto da Polícia de Segurança Pública], e mandou avaliar a antiga cadeia «para ser vendida em praça».

Apesar da reconhecida falta de segurança e de higiene da cadeia, só em 1872, na reunião de 2 de Maio, o presidente da edilidade propôs a construção de uma cadeia e tribunal judicial «e que não podendo a Câmara com os seus meios ordinários ocorrer a avultada despesa de tão importante melhoramento, propunha por isso para esse fim que se levantasse por meio de empréstimo a quantia de 9.824$000 réis, que em tanto foi orçada a despesa daquele edifício.» 

Cândido Ventura adquiriu a cadeia e os terrenos anexos e ali construiu o seu chalet. Praça da República/ R. Guerra Junqueiro. Foto 1920
A autarquia contraiu, então, dois empréstimos bancários, um de 9.862$070 réis e outro de 8.460$000 réis. Além do serviço da dívida bancária, a Câmara suportou também todas as despesas com o aterro da caldeira, ali existente.

Em 9 de Abril de 1874, realizou-se a cerimónia de lançamento da primeira pedra. A obra iniciou-se em 1 de Julho de 1878 e ficou concluída em 1879.

No dia 25 de Maio de 1879, o edifício da cadeia e tribunal foi inaugurado pelo Presidente do Conselho de Ministros, Fontes Pereira de Melo, na presença do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Andrade Corvo, do Ministro da Justiça, Couto Monteiro, do Procurador Régio, Faria d’Azevedo e demais entidades locais.

No dia 1 de Julho de 1879, a cadeia recebeu os primeiros presos.

Arco da porta principal do edifício. 1 de Julho de 1878, início da obra. 1 de Julho de 1879, recepção dos primeiros presos. 1 de Julho de 1967, inauguração das instalações dos Paços de Concelho.
O edifício é de planta rectangular, com um pátio interior a céu aberto, com um poço, já aterrado, e arco com sineta no telhado. A fachada principal é rematada por um frontão triangular, onde foi colocado um brasão, que se presume ter pertencido a Miguel Varela de Mascarenhas e que terá sido retirado da antiga cadeia, instalada numa propriedade daquele nobre. Na fachada destacam-se cinco varandas. O imóvel é uma construção em dois pisos, em que as linhas verticais da empena apareciam solenizadas, ao nível do telhado, por quatro remates piramidais, já desaparecidos. Aterrado foi o poço que existia no pátio interior.  

No rés-do-chão estavam instalados o cartório do escrivão, a casa do carcereiro, a casa de arrecadação, a repartição de finanças e dez celas para presos (homens). No 1.º andar estavam instalados o tribunal judicial e mais dez celas para presos (mulheres).

Em 1957, foi inaugurada a nova cadeia de Montijo.

O tribunal ali funcionou durante oitenta anos, até ser inaugurado o Palácio de Justiça, no dia 20 de Dezembro de 1959, pelo Ministro da Justiça Artur Varela.

Desocupado o edifício das suas funções originais, foi adaptado para receber a Escola Comercial e Industrial.

Construída a escola, o edifício passou então a albergar, a partir de 12 de Fevereiro de 1965 e em condições precárias, a Câmara Municipal, que ali se instalou definitivamente em 1967.

No dia 1 de Julho daquele ano, o Ministro do Interior inaugurou os novos Paços do Concelho e a Praça Gomes Freire de Andrade.
Ruky Luky 

Um comentário:

  1. É importante e muito formativo continuar a oferecer à população de Montijo, especialmente aos mais novos,muito da história da sua terra e da importância que tem todo o seu passado. Estas memórias só valem se forem, de quando em vez, ressuscitadas, porque a memória dos homens é curta.
    Independentemente da realização que este projecto traz ao autor, ele valerá sempre por si próprio e permanecerá no tempo.
    Mais uma vez um grande obrigado ao Rui.

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