Sede da União Mutualista Nossa Senhora da Conceição, fundada em 1872. Foto 1961 |
O
Constitucionalismo marca o desenvolvimento do movimento associativo em Portugal.
Segundo
Fernando Marques da Costa, “a partir dos anos 50, [1800] com a estabilização da
vida política, começam a desenvolver-se diversas formas de associativismo, que
não se revestem ainda, naturalmente, das características do associativismo de
classe.
O
próprio peso da tradição corporativa conduz essas novas formas de
associativismo para o mutualismo. A forma adoptada é frequentemente
interclassista, reunindo indistintamente operários, patrões e mesmo
comerciantes, num aclassismo que é bem expressão de uma realidade
predominantemente pré-industrial”.
De
facto, o associativismo de classe só se desenvolveria a partir da década de
oitenta, com o advento do ideário socialista, tendo sido também, a partir
daquela data, que se desenvolveu o movimento anarquista.
Assim
aconteceu também em Aldeia Galega do Ribatejo, onde a progressiva substituição
da manufactura pela máquina se viria a tornar fonte de novos conflitos,
contradições e interesses, numa sociedade que, depois de ter ultrapassado uma
grave crise económica e social, mostrava já sinais de prosperidade no início do
século XX. “Comparando este recenseamento com o de 1890 verificou ainda a
Comissão (de Recenseamento) que no prazo de 10 anos (1890-1900) houve neste
concelho um aumento de 403 fogos habitados (...) e de 1382 habitantes (...)”,
esclarecia o Administrador do Concelho.
Confrarias
e corporações, instituições associativas tradicionais, precedentes históricos
das associações cedem então lugar, segundo Albert Meister, a mais complexos e
especializados processos associativos: patrióticos, educativos, de socorros
mútuos, comerciais, agrícolas, de classe, etc.
Em
1837,
a Rainha D. Maria II aprovou os Estatutos da Sociedade Patriótica “que alguns
Cidadãos de Aldegallega do Riba-Tejo pretendem estabelecer naquella Villa, com
o fim de sustentar por todos os meios legítimos o Systema Representativo, e
promover conjunctamente com elle a felicidade da Pátria”.
Herdeira da Sociedade Recreativa, a Sociedade Filarmónica 1.º de Dezembro só viu os seus estatutos aprovados em 1906.
|
Dezassete anos depois, foi fundada a Sociedade Recreativa que deu origem à Sociedade
Filarmónica 1º de Dezembro, cujos estatutos, aprovados em 1906,
compendiavam a actividade que vinha a desenvolver: “A Sociedade tem por fim
abrir aulas gratuitas nocturnas de música, abrir aulas diurnas ou nocturnas de
instrução primária, de dança, de ginástica e de esgrima; prestar socorros nos
incêndios ou em outros quaisquer sinistros; promover tudo quanto seja
necessário ao bem estar, moralidade e instrução dos sócios”.
Os
ideais mutualistas e a laicização do associativismo oriundo das confrarias
originaram o aparecimento, em 1872, da Associação Fraternal do Montepio de Aldegalega sob a
invocação de Nossa Senhora da Conceição e, quatro anos mais tarde, do Montepio Divino
Espírito Santo. Em 1886 foi instituído o Montepio Nova Aliança e, em 1905,
o Montepio
Aldegalega Operária.
A
partir da segunda metade do século XVIII começou a moldar-se um novo figurino
para a vila. Por essa altura, intensificou-se o movimento emancipador contra a
monarquia, de forte pendor anarquista, que ocasionou, mais tarde, em 1908,
a eleição do primeiro presidente republicano da Câmara, Manuel Ferreira
Giraldes, eleito pelo Partido Republicano Português, e, no plano social,
fermentou o desabrochar de inúmeras associações, que transportavam consigo o
ideal republicano e de classe.
Estas
associações, além de fixarem como objectivo da sua constituição a luta pelos
interesses profissionais dos seus associados, preocupavam-se também com a
divulgação cultural. Assim, por exemplo, a Associação dos Operários da Indústria Corticeira
delimitava como fins a atingir, além do estudo e defesa dos interesses
económicos, sociais e profissionais comuns aos seus associados em especial e em
geral da classe que a associação representava, o estabelecimento de mais
escolas, bibliotecas e gabinetes de leitura. Pretensão semelhante, prosseguia a
Associação
de Classes dos Trabalhadores Rurais Aldegalenses. Assiste-se mesmo,
nesta altura, a um fenómeno curioso. Devido à preocupação que as associações
punham na divulgação da leitura, havia pessoas que sabiam ler, mas não sabiam
escrever.
Antes
da implantação da República, apareceu mais uma associação cultural e a primeira
associação desportiva. Esta chamou-se Aldegalense Sport Club, fundada em 1909
e, em 1948,
fundindo-se
com outros dois clubes, o Avenida Futebol Clube e os Onze Unidos de Futebol,
deu origem ao Clube Desportivo de Montijo. Quanto à associação
cultural denominava-se Grupo Musical Baltazar Manuel Valente, fundado
também em 1909.
Posteriormente passou a chamar-se Musical Club Alfredo Keil, mantendo durante
anos uma tuna musical e um orfeão.
Ainda
nessa data, foi lançado um movimento de opinião “sobre a necessidade e a
conveniência da fundação
d’uma caixa económica em Aldegallega”, porque “baseadas no princípio
da união e conjugação de interesses, no auxílio recíproco, para o embate das
luctas da vida, que cada vez mais se encarniçam e dificultam, representam,
quando bem comprehendidas e honestamente orientadas, forças poderosas que
removem os inúmeros entraves que contrariam a expansão de muitas actividades e
o aproveitamento de muitas energias.
Na
vida commercial, como na vida agrícola (...) é onde mais intensamente se faz
sentir a necessidade da instituição destes estabelecimentos, que facilitam as
iniciativas e boas vontades dos que pretendem trabalhar e progredir, anniquilando
a usura, que tanto suor absorve e tanto esforço invalida e inutilisa.
Aldegallega
é, incontestavelmente, pelas condições especiais do seu meio, pela divisão da
sua propriedade e pelo desenvolvimento sempre crescente do seu commercio, um
terreno excelente, aonde a semente, uma vez lançada, há-de fructificar
exuberantemente.
Aos
serviços, aos trabalhadores, aos operários, a todos enfim os que arrancam dia a
dia á força dos seus braços os mesquinhos salários com que se suprem, prestam
as caixas económicas o incalculável serviço de lhes augmentar com um juro
rasoavel as pequenas ecónomias que n’ellas depositam (...)”
Ao
ser interpelado pelo Intendente de Sanidade Pecuária sobre “os trabalhos
efectuados n’esse concelho no sentido da propaganda do Crédito Agrícola e quais
as suas impressões acerca dos resultados dos mesmos, ou sejam as rasões da
facilidade ou dificuldade da adaptação da citada lei a essa região”, o
Administrador do Concelho respondia em 9 de Julho de 1913: “a propaganda do
Crédito Agrícola tem sido feita n’este concelho com o maior enthusiasmo pelos
senhores Manuel de Jesus Callado, José Pereira Fialho e Camillo Chaves e os
resultados obtidos são de forma a merecer os meus elogios.
Por
estes quinze dias deve estar já funcionando a Caixa de Crédito Agrícola que
conta um número de sócios aproximadamente a 50.
A
lei adaptou-se a este meio com relativa facilidade e hoje é aceite com todo o
amôr”.
Os
comerciantes tinham já constituído por esta altura a Associação Comercial.
Com
o advento da República surgiram as primeiras formações partidárias, o Centro
Republicano Democrático e o Centro Republicano Evolucionista 31 de Janeiro,
que fomentaram conferências, palestras e encontros, em suma, o debate de ideias
numa das épocas mais palpitantes da nossa história.
A
associação mais importante, que se fundou no período pós-implantação da
República, foi a Banda Democrática 2 de Janeiro, instituída em 1914,
para satisfação do momento político, e que resultou duma profunda cisão da
Sociedade Filarmónica 1º de Dezembro.
A
Banda Democrática, cujos músicos eram simpatizantes do Centro Republicano,
tornou-se o centro de animação do Partido Republicano.
Além
desta e das já citadas, tomaram corpo nesta altura, as seguintes associações de
carácter laboral e/ ou cultural: Junta Local do Livre Pensamento, Sindicato Agrícola de
Aldeia Galega, Associação de Classe das Operárias Chacineiras, Associação de
Classe dos Trabalhadores Rurais da Jardia, Lançada e Sarilhos Grandes, Associação de Classe dos Trabalhadores Rurais
de Canha, Associação de Classe dos Trabalhadores Rurais Aldegalenses, Federação Operária Aldegalense, Associação dos Operários da Indústria
Corticeira, Cooperativa União dos
Trabalhadores Rurais Aldegalenses e a Sociedade Cooperativa União Piscatória.
Sociedade
cooperativa de consumo, a União Piscatória, constituída, após a dissolução da
Associação de Socorros Mútuos com o mesmo nome, em 1913, e
prosseguindo como seus objectivos, segundo o artigo 2º do capitulo I dos seus estatutos, “o
fornecimento aos sócios de géneros alimentícios, tabacos e artigos necessários
ao uso doméstico”, é fruto do contexto social criado pelo desenvolvimento
industrial, principal responsável pelo incremento do movimento cooperativista.
Como
outras associações similares, a Sociedade Cooperativa União Piscatória
canalizava também os seus esforços na formação social e cívica dos seus
associados, os pescadores, promovendo e difundindo a instrução. Perpetuando a
tradição de auxílio e assistência, a Sociedade apoiava também as viúvas e as
filhas órfãs dos sócios falecidos.
Com
o advento do Estado
Novo muitas destas associações eclipsaram-se e outras ganharam forma
de acordo com o novo contexto político. Surgiram então, a substituir as
associações de carácter essencialmente profissional, os Sindicatos Nacionais dos Operários de
Chacinaria, dos Descarregadores de Mar e Terra, dos Operários Corticeiros, a
Casa do Povo de Montijo, a Casa de Povo de Canha, o Grémio da Lavoura de
Montijo e o Grémio de Comércio de Montijo e Alcochete.
Em
1937,
por despacho do Sub-Secretário de Estado da Providência Social, foram
dissolvidas todas as Associações de Socorros Mútuos de Montijo, constituindo-se
uma nova instituição com o nome de União Mutualista de Nossa Senhora da Conceição,
veículo importante da solidariedade social e das formas fundamentais de
assistência na saúde, na velhice, na viuvez, na inabilidade, etc.
As
décadas de 30 e 40 são assim marcadas pela aridez que vai caracterizando a vida
cultural do Concelho. A partir de 1926, à excepção do Ateneu Popular de Montijo, que
surgiu em 1939
e que tem uma configuração retintamente cultural, as associações que se vão
constituindo têm uma feição estritamente recreativa ou desportiva. O Ateneu,
caracterizado pelos seus estatutos como tendo por fim “desenvolver entre os
seus associados e familiares a educação intelectual e física,
proporcionando-lhes meios de cultura e distracção e a expansão do desporto”, é
o resultado do aparecimento em diversas zonas do país, principalmente no sul,
do movimento esperantista. Neste sentido, o grupo que se formou começou por
estudar a língua universal, o esperanto, para alargar, progressivamente, a sua
acção ao domínio da instrução, criando cursos de alfabetização, uma biblioteca
e cursos de História e Língua Pátria, Dactilografia e Oratória.
Apresentando
como divisa “Cultura e Progresso”, o Ateneu Popular de Montijo tornou-se
acérrimo promotor da cultura. Apesar da censura e da repressão, a vida cultural
no concelho não se apagou totalmente, sustentada que foi pelas associações.
Registe-se
a importância do Ateneu Popular de Montijo, como foco de resistência, e o papel
empreendido na divulgação da música, como já foi mencionado, pela Sociedade
Filarmónica 1º de Dezembro e pela Academia Musical União e Trabalho, de Sarilhos Grandes.
A Banda Democrática 2 de Janeiro desempenhou também um papel importante na
defesa dos ideais republicanos e democráticos e teve uma acção notável no campo
teatral e musical.
O
aparecimento de associações de cultura e recreio alia-se à existência de tempos
livres e, por esse motivo, a sua expansão é ainda limitada, em virtude do
número de horas de trabalho diário ser elevado.
Surgiram
no concelho entre
1926 e 1960 três sociedades recreativas: a Sociedade Recreativa Atalaiense (1946),
cuja actividade começou por estar ligada, sobretudo, à realização de bailes e
espectáculos musicais, a Sociedade Recreativa Progresso Afonsoierense (1952)
apresentada pelos seus estatutos como uma “Sociedade de Recreio e Instrução”,
que se fundou, conforme opinião emitida por alguns associados, como uma
alternativa à taberna e que integrou durante algum tempo no seu seio um grupo
cénico, e a Sociedade
Recreativa Cruzamento de Pegões (1952).
Ainda
neste período formou-se a Tertúlia Tauromáquica de Montijo (1948), que
promove a festa taurina, e da qual resultou o Grupo de Forcados Amadores de Montijo,
a Sociedade
Columbófila (1950), o Agrupamento 72 do Corpo Nacional de Escutas (1957),
apoiado pela Igreja Católica, nomeadamente pelo Centro Paroquial de Montijo e
cujos fins são a formação integral dos jovens e três clubes desportivos: o Clube Desportivo
de Montijo (1948) resultante como já foi referido atrás da fusão de
outros três clubes, o Juventude Futebol Clube Sarilhense (1953) e o Clube Imperial
Montijense (1959).
Daqui
até 1974 vão fundar-se ainda três clubes desportivos e uma sociedade
recreativa. Os primeiros são: União Futebol Clube Jardiense (1963), Águias Negras
Futebol Clube (1964) e “O Palmeiras” - Clube Montijense de Desportos (1963).
A sociedade recreativa formou-se no Bairro do Areias – Sociedade Recreativa do Bairro do Areias
(1965).
Após
a Revolução
de 25 de Abril de 1974, brotaram novas associações, embora, a maior
parte, de cariz eminentemente desportivo ou recreativo.
No
campo etnográfico, da defesa de costumes e tradições, assistiu-se à formação, nas
freguesias limítrofes ou rurais, de Ranchos Folclóricos. No campo cultural, é de
realçar o aparecimento, em 1979, do Circulo Histórico-Cultural do Montijo,
factor importante para a sensibilização, defesa e protecção do Património
Histórico- Cultural, mas que teve vida efémera, embora influente.
A
liberdade de associação permitiu que se constituíssem as mais variadas
associações, que corresponderam a interesses imediatos ou a objectivos cuja
concretização se prolongam no tempo.
A
acuidade dos problemas sociais e, dentro destes, os relacionados com a terceira
idade, conduziram ao aparecimento de Associações de Idosos, a partir de 1980. Em 1996,
instituiu-se um centro de acolhimento para crianças e adolescentes integrado no
Centro
Social de S. Pedro do Afonsoeiro.
PS. A revisão deste estudo demonstrará que há associações que, entretanto, se extinguiram e outras que se ergueram. É um trabalho a empreender, brevemente, não só para o actualizar, mas também para que se preencham as lacunas que evidencia.
Ruky Luky
Nenhum comentário:
Postar um comentário