quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Atalaia

Um Retrato da Romaria no Final do Séc. XIX


«A chamada festa grande teve este ano uma concorrência extraordinária.
Calcula-se em mais de 20.00 o número de pessoas que compunham essa concorrência, formando um conjunto variado e encantadoramente pitoresco.
Grupos de homens e mulheres num pêle-méle (desordenados, a esmo) deveras extravagante e nalguns casos assaz fresco e livre repousavam aqui e ali em atitude descuidada e reveladora dum extenuamento, próprio de quem perdera dia e noite preso às manifestações do prazer.
Filarmónicas, guitarras e descantes vários, soltando notas estropiadas e trechos de música desconexa e por vezes horripilante faziam um barulho de ensurdecer; enquanto os romeiros práticos, de farnel estendido se atascavam em suculentas merendas regadas por sucessivas libações de sumo de uva.
Danças improvisadas, em que costureiras se desengonçavam, correspondendo às piruetas dos adónis que lhes serviam de par, disfarçando-se de salamaleques libidinosos a amantéticos.
Velhas matronas rechonchudas como basílicas, aquecidas pelos arrulhos dos novos e lembrando-se dos bons tempos em que eram requestadas por mancebos atrevidos e pouco respeitadores, transudavam languidez, e arrastavam a asa aos seus maneis, pareciam dirigir-lhes convites lascivos.
E apesar da crença no divino, do prazer, do amor e do carrascão, nem uma desordem séria, nem uma inconveniência que desafiasse um protesto violento.
A polícia da festa foi feita com a máxima sisudez e prudência. Tanto a força armada, como a polícia de Lisboa e cabos de segurança, uns e outros sob as ordens dos dignos administradores substitutos do concelho e regedor, houveram-se por uma forma muito correcta e digna de louvor.
À parte a prisão de alguns gatunos que vinham pescar nas águas turvas,mas  que ainda fizeram mão baixa de uma carteira contendo 6$100 réis e um relógio de ouro de uma senhora, e de alguns outros de que a autoridade tomou conta.»

In «O Aldegallense», 6.09.1896»


Ruky Luky























Um comentário:

  1. É uma maravilha e um serviço extraordinário prestado à comunidade o trazer à luz do dia, e a propósito, tais notícias. Vale pelo acontecimento em si, pelos valores que representa, e para lembrar aos mais novos, ou outros pouco informados, que no século XIX (1896) Aldegalega já tinha um jornal semanário, o que é um atestado da importância da vila. Parabéns ao Rui.

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